No DF o Índice de 62% de policiais militares com um sobrepeso está preocupando os especialistas

PMDF havia solicitado a compra de um aplicativo para que a tropa tivesse acesso a academias. A proposta foi vetada pelo TCDF, mas médicos destacam que esses agentes precisam estar em forma para exercer suas funções

Mais da metade da tropa de policiais militares do Distrito Federal está com sobrepeso e a estatística tem preocupado a corporação, como destacava, em 12 de junho, o edital que solicitava a contratação de um aplicativo que daria acesso a academias de ginástica aos militares. De acordo com o edital, 62,78% do efetivo (10.423) estava acima do peso.

A Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) tentou, sem sucesso, contratar esse aplicativo, justificando que o sobrepeso prejudicaria a qualidade do serviço prestado à comunidade e  comprometeria o orçamento da PMDF com gastos em saúde curativa. No entanto, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) suspendeu a contratação da plataforma alegando “possíveis irregularidades”. Especialistas ouvidos pelo Correio falaram sobre a importância dos profissionais de segurança pública terem uma rotina de exercícios e se manterem em forma.

Para entrar na PMDF, além das provas tradicionais de um concurso público, é preciso passar por um teste de aptidão física (TAF), que avalia flexibilidade, composição corporal, força e resistência aeróbica, por meio de um conjunto de testes físicos que, geralmente, inclui exercícios de musculação, corrida e natação. De acordo com portaria interna da PMDF, os policiais da ativa devem se submeter ao TAF anualmente. Para assumir funções na área de inteligência da PM, por exemplo, é preciso estar com o TAF em dia, caso contrário, não é possível se inscrever para assumir funções nesse departamento.

De acordo com Relatório de Gestão de 2022, o percentual de aprovados no TAF interno foi menos de 20%, bem abaixo da meta de 70%. “O papel do policial militar é essencial para ordem pública, muitas vezes com tratamento ostensivo. Para cumprimento das suas atividades, espera-se que o policial esteja em plena forma física, capaz de lidar com enfrentamentos e situações de conflito”, destacou o especialista em concursos públicos Eduardo Cambuy.

Coração

Policial militar no Distrito Federal desde 2010, Airton* (nome fictício) conversou com o Correio e falou sobre a sua rotina. “Os policiais fazem atividade física por conta própria. Eu faço jiu jitsu há 13 anos de três a cinco vezes na semana, desde que entrei na corporação”, conta. Tem academias em vários batalhões da PM, disponíveis para os policiais. No expediente administrativo, duas vezes na semana, o policial é liberado uma hora antes para fazer atividade física. Alguns vão correr, outros jogam bola, outros fazem jiu jitsu”, acrescenta.

Médico coordenador da Cardiologia do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Carlos Rassi explicou que “a obesidade pode gerar uma piora na pressão arterial, gerando hipertensão, além de aumentar o colesterol e gerar piora nos níveis glicêmicos. Os obesos têm maior incidência de diabetes. Tudo isso pode gerar uma sobrecarga no sistema cardiovascular. O coração passa a ter mais dificuldade de bombear o sangue para o organismo e vai hipertrofiando. A obesidade pode causar aumento de placas de gordura no organismo, o que aumenta a possibilidade de infarto”, explica.

“O policial depende do corpo para trabalhar. É preciso um bom preparo físico para exercer bem a profissão. Se o policial não está fisicamente preparado, quem paga o preço é o cidadão. Recomendações para controle de peso são baseadas em diversas frentes. O pilar é atividade física, mas também é possível controlar o sobrepeso com alimentação e medicamento. É preciso encontrar a forma mais em conta financeiramente”, analisa o cardiologista Carlos Rassi.

Mariana Melendez, nutricionista da clínica Nutrição S/A, acredita que a disciplina dos militares deve ser aplicada também na alimentação. “É preciso aproveitar a rotina disciplinada para ter uma alimentação consciente. Alimentação saudável vai ajudá-los a ter um sono mais adequado e o intestino a funcionar melhor. É importante ter uma alimentação específica para a rotina de treinos”, sugere.

Academia gratuita

Em junho deste ano, a PMDF abriu um pregão para contratação de um aplicativo no valor de R$ 6,6 milhões. O objetivo seria a prestação de serviços continuados por meio de plataforma digital de bem-estar corporativo ao pessoal da PMDF. No entanto, após analisar a proposta, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) suspendeu a contratação da plataforma após apontar possíveis irregularidades.

De acordo com o tribunal, entre outras irregularidades, faltou a corporação apresentar estudos comparativos que evidenciem a relação custo-benefício de outras soluções possíveis para promoção da saúde aos policiais militares, a fim de comprovar a eficiência e economicidade da escolha adotada, considerando, também, eventual coparticipação pelos usuários. Além disso, o TCDF também apontou ausência de cláusulas de regulação e controle pela PMDF quanto à manutenção de acesso aos benefícios pelos policiais, estabelecendo regras de controle e, caso necessário, de prestação de contas, aos beneficiários para que possam usufruir da plataforma.

Procurada pela reportagem, a assessoria da PMDF não se manifestou sobre o assunto até o fechamento desta edição.

Palavra de especialista, por Benedita Ferreira Machado (cardiologista)

Primeiramente, precisamos compreender a definição mais atual da obesidade, que a classifica como uma doença crônica, diretamente relacionada ao desenvolvimento de várias outras doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, que aumenta, significativamente, o risco de eventos cardiovasculares graves e fatais, como infarto, AVC e morte. Então, do ponto de vista médico, a obesidade, não pode ser reduzida a uma questão estética, porque uma pessoa obesa tem, necessariamente, uma doença e precisa de tratamento. Assim como uma pessoa com sobrepeso tem um alto risco de desenvolver a doença e também precisa de tratamento.

O impacto dessa doença para os profissionais de segurança pública, em particular entre os policiais militares, torna-se mais grave e preocupante, à medida que, consideramos outros fatores de riscos adquiridos, em decorrência da sua atividade fim, como o alto nível de estresse crônico, as irregularidades de sono e da alimentação em virtude do cumprimento de escalas de serviço.

Além disso, nós sabemos que o excesso de peso leva a uma sobrecarrega nas articulações, principalmente do quadril e joelhos. E, mais uma vez, torna-se mais grave para eles devido a necessidade do uso prolongado do fardamento e EPIs pesados por longos períodos.

Portanto, a obesidade e o sobrepeso, somados a esses fatores específicos, interferem na atividade do profissional segurança pela carga de adoecimento que geram, comprometendo a funcionalidade e a performance do profissional, acarretando afastamentos temporários frequentes e, até mesmo, afastamentos em definitivo, de forma precoce, com prejuízos a toda a sociedade.

O combate a essa condição de saúde depende de medidas multidisciplinares. Mas, o que encontramos em todos os “guidelines ” médicos é a indicação de atividade física regular tanto para o tratamento quanto para a prevenção da obesidade. É importante ressaltar que a atividade física não é só recreativa. Para fins terapêutico o treino precisa ter planejamento e metas. Por isso é tão importante a participação de profissionais de educação física no processo.

Além de atividade física, precisamos mudar hábitos alimentares, reduzir os níveis de estresse e, em alguns casos até lançar mão de medicações ou procedimentos para tratar e reabilitar um paciente obeso.

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