A mostra de Juan Pedro Gutiérrez e George Fogaça saiu do espaço e será exibida no Museu Nacional. Curadora fala em censura institucional
Obras do pintor e escritor cubano Pedro Juan Gutiérrez e do goiano Gerson Fogaça estão no centro de mais uma polêmica entre o governo federal e o meio cultural. A exposição, inicialmente marcada para abrir nesta quinta-feira (13/06/2019), no Museu dos Correios, foi retirada do espaço original por não atender às “políticas de associação à marca dos Correios”.
A mostra intitulada O Sangue no Alguidá, Um Olhar Desde O Realismo Sujo Latino-Americano, que reúne 50 peças dos dois artistas, abrirá ao público nesta quinta-feira (13/06/2019), em nova casa: o Museu Nacional da República (Eixo Monumental). O espaço é administrado pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal (Secec), enquanto o Museu dos Correios é de responsabilidade da empresa pública do governo federal.
De acordo com a produção da exposição, nessa segunda-feira (10/06/2019), dois dias antes da abertura para o público, o Museu dos Correios avisou que cinco obras dos artistas, que retratavam cenas de sexo presentes na literatura de Guitiérrez, não estavam de acordo com as novas políticas institucionais. O espaço, então, ofereceu duas opções: a retirada das pinturas ou o cancelamento da mostra.
Como a demanda foi rejeitada pelos artistas, o impasse se deu. Gutiérrez e Gerson Fogaça optaram por retirar a exposição e, segundo a assessoria de imprensa da mostra, deu-se início à busca por um novo espaço.
Normas institucionais
“Cinco obras precisariam ser retiradas por não ‘estarem de acordo com as normas institucionais’. Dessa forma, o artistas optaram por retirar a exposição do local”, disse a assessoria de imprensa da mostra.
Por meio de nota, o Museus dos Correios confirmou que a retirada das obras foi solicitada. “A exposição O Sangue no Alguidá é um diálogo entre as obras do escritor cubano Juan Pedro Gutiérrez e do pintor goiano Gerson Fogaça. Questionada sobre o material, a produção informou que não haveria conteúdo contrário às normativas internas da empresa. No entanto, durante a aprovação do catálogo, foram observadas algumas imagens que não condizem com a política de associação da marca Correios. Assim, foram feitas duas sugestões à curadoria: dar andamento à exposição, com a retirada das imagens em questão; ou não realizar a exposição. Tendo em vista a recusa da organização em retirar as imagens indicadas, a exposição foi recusada”, informa a empresa pública.
Malu da Cunha, produtora executiva da exposição, alega que há cerca de 4 meses enviou o projeto e o texto da mostra. “Só se eles não leram o material. Lá estava tudo explicado. O Fogaça narra visualmente a estética do Juan Pedro, que envolve sexualidade”, analisa.
Nudez
Nas obras em questão, George Fogaça retrata a poética do escritor Pedro Juan Gutiérrez – que também expõe pinturas na mostra. A polêmica estava justamente nas peças que contêm conteúdo sexual, com desenhos de genitais masculinos e femininos. “Não são construções sexuais, ele traz representações do trabalho do autor cubano, que aborda a miséria e a sexualização no cotidiano das pessoas”, explica Malu da Cunha.
A curadora da exposição, Dayalis Gonzáles Pérdomo, chama o episódio de “censura institucional”. “Já sabíamos que O Sangue no Alguidá seira transcendental, justamente porque adentra as vísceras da cultura ocidental, tratando de sexo, violência, marginalidade e pobreza na América Latina”, colocou.
Malu da Cunha afirmou, ainda, que sugeriu diversas medidas para o Museu dos Correios, como o aumento da classificação indicativa (de 16 para 18 anos) e a colocação de panos em frente às telas de conteúdo mais sensível.
A mostra conta com patrocínio do Fundo de Arte e Cultura (FAC) e Programa Estadual de Incentivo à Cultura (Lei Goyazes), dois programas de incentivo do estado de Goiás.
Mudança de local
Após o impasse com o Museu dos Correios, a exposição O Sangue no Alguidá, Um Olhar Desde O Realismo Sujo Latino-Americano foi abrigada no Museu Nacional da República. O evento abre para o público nesta quinta (13/06/2019) se segue em cartaz até 6 de agosto.
Nesta quinta-feira, também, ocorre a palestra Encontro com Pedro Juan Gutierrez, com mediação do jornalista Sergio de Sá e participação da curadora Dayalis Gonzáles Pérdomo, na Casa da América Latina. As vagas são limitadas.
“Pedro Juan é importante porque ele lançou essa trilogia suja de Havana, mostrando um lado de Cuba que não se conhecia, com certa obscenidade e sinceridade do narrador que se confunde quase sempre com o próprio autor”, explica Sérgio de Sá.
O Sangue no Alguidá, Um Olhar Desde o Realismo Sujo Latino-Americano No Museu Nacional da República (Eixo Monumental), de 13 de junho a 6 de agosto. Classificação indicativa 16 anos. Entrada gratuita