A desavença começou após o magistrado não acatar o pedido de se declarar impedido de julgar o caso e negar a suspensão do acordo
O embate entre o juiz Carlos Frederico Maroja, da Vara de Meio Ambiente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), e a promotora Marilda dos Reis Fontinele, da Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ganhou novos capítulos.
O palco da desavença é o processo que questiona o acordo firmado entre os empresários do grupo Paulo Octávio com o poder público, responsável pela liberação do funcionamento do JK Shopping.
Na última semana, Maroja negou o pedido de desistência apresentado por Marilda. Ela abriu mão da ação civil pública que apontava irregularidades e pedia suspensão do acordo. Para a promotora, a medida estava “fadada ao insucesso” por estar sob análise de Maroja – juiz responsável pela homologação da decisão favorável aos donos do centro comercial.
Na sentença, o juiz alfinetou Marilda: “A convicção da autora acerca da ‘conduta temerária’ ou ‘desleal’ do juiz, como vem propagando à imprensa, não é motivo objetivo para a extinção do processo iniciado sob o nome e a responsabilidade do MPDFT”. Além de negar o pedido de desistência, Maroja determinou a intimação de outras duas promotoras: Andréa de Carvalho Chaves e Luciana Medeiros Costa.
Marilda reagiu na última sexta-feira (07/06/2019). Impetrou um mandado de segurança coletivo com pedido de liminar com objetivo de “desconstituir a decisão manifestamente teratológica, ilegal e inconstitucional” de Maroja.
No pedido, Marilda argumenta que houve “conduta parcial do magistrado, que desde o início entendeu a ação como afronta pessoal” e que Maroja pré-julgou o caso ao afirmar, na decisão liminar que negou a suspensão do acordo, que “os atos foram praticados por agentes capazes” sem considerar, segundo ela, todas as irregularidades apontadas pelo Ministério Público.
Além disso, o mandado de segurança questiona a intimação das promotoras Andréa de Carvalho Chaves e Luciana Medeiros Costa. “O magistrado chamou as promotoras de Justiça signatárias do acordo impugnado para integrarem a lide, sem esclarecer a que título: se para a defesa dos interesses próprios ou dos réus.”
Andréa representou o MPDFT na elaboração e assinatura do acordo com os empresários. Anos depois, ela se declarou suspeita para atuar em um processo de improbidade administrativa envolvendo o grupo Paulo Octávio. Desde então, o MP entende que ela não pode atuar em nenhum processo envolvendo a empresa. Luciana também participou da elaboração do acordo. As duas promotoras não foram localizadas para comentar o assunto.
“Processualmente não tem cabimento. Não há razão para continuar com uma ação apontando irregularidades em um acordo que está sendo julgada pelo juiz responsável pelo acerto. E, agora, ele nega o meu pedido de desistência”, afirmou a promotora.
O TJDFT informou, por meio de nota, que “a manifestação do magistrado ocorre através de suas decisões no processo”. “Eles são proibidos, por lei, de emitir qualquer declaração, por qualquer meio de comunicação, sobre processo que esteja julgando ou que esteja sendo julgado por outro magistrado, sob pena de sofrerem penas disciplinares”, continua o texto.
Entenda o caso
A construção do JK Shopping ignorou normas ambientais e urbanísticas. No entanto, um acordo dos empresários com o MPDFT, homologado pela Justiça, permitiu a regularização do centro comercial. Ficou acertado que os empreendedores, pelos danos causados pelas obras, compensariam a comunidade com a construção de uma escola no Sol Nascente e a realização de benfeitorias no Parque do Cortado.
Após investigar possíveis irregularidades no acordo, a promotora Marilda dos Reis Fontinele pediu a suspensão do mesmo. De acordo com ela, o acerto não exigiu que o shopping se adequasse a todas as regras exigidas para a liberação de espaços comerciais. “Escolheram as normas que aplicariam, quais não aplicariam e se tornaram administradores e executores do processo de regularização”, explicou Marilda. Além disso, segundo a promotora, o acordo determinou a expedição de atos administrativos, como o Habite-se, que caberia ao Governo do Distrito Federal (GDF).
O pedido foi negado pelo juiz Carlos Frederico Maroja. Marilda explica que esperava que o magistrado se declarasse suspeito não só por ele ter homologado o acordo mas também por ter “participado ativamente da construção” do documento. “Foram quatro audiências, todas com a presença dele. Está tudo gravado em áudio, e a degravação do que foi dito compõe o processo no qual pedimos a suspensão do acordo de regularização”, afirmou.
Assim, ao não se declarar suspeito, Maroja julgou improcedente a investigação feita pelo MPDFT apontando irregularidades no acordo homologado por ele mesmo. “Me frustro porque meu trabalho desde 2013 foi jogado fora. E estamos falando de um réu que responde por seis ações criminais, além de improbidade administrativa, em razão de problemas na aprovação do acordo que estamos questionando”, completou a promotora.