EMILIA PÉREZ: A FRUSTRAÇÃO DE UM FILME QUE NÃO CUMPRE SUAS INDICAÇÕES AO OSCAR

CRÍTICA POR: Fernán Barretto

Emilia Pérez começa com uma premissa intrigante e promete uma imersão profunda nas
complexidades da identidade e da cultura. Sob a direção de Jacques Audiard, o filme
parecia ser uma oportunidade de explorar questões delicadas e universais, misturando o
drama com elementos musicais para criar uma experiência cinematográfica única. No
entanto, à medida que a trama se desenrola, o que poderia ser uma reflexão sensível e
empática rapidamente se desintegra em uma sequência de escolhas narrativas
desastrosas, deixando uma sensação de frustração no público.
A história gira em torno de Rita Moro Castro (Zoë Saldaña), uma advogada designada para
ajudar um membro de um cartel mexicano a passar por uma cirurgia de redesignação
sexual para escapar das autoridades. A premissa oferece um grande potencial para
explorar tensões emocionais complexas, dinâmicas de poder e questões de identidade de
gênero, mas o filme rapidamente perde o rumo. Em vez de se aprofundar nesses temas, a
narrativa se transforma em um emaranhado confuso de cenas desconexas, onde as
personagens parecem desorientadas em suas próprias jornadas. O que deveria ser uma
trama envolvente e provocadora se dissolve, deixando apenas vestígios de uma proposta
que jamais se concretiza de forma satisfatória.
Um dos maiores problemas de Emilia Pérez é a tentativa de mesclar drama e musical. Essa
fusão forçada, longe de enriquecer a trama, serve apenas para interromper seu fluxo
natural, criando uma sensação de desconexão com o público. As sequências musicais não
são integradas de forma orgânica à narrativa. Pelo contrário, parecem ser um acréscimo
estranho, sem qualquer justificativa que explique a mudança de tom. Em vez de intensificar
as emoções ou aprofundar a história, as músicas se tornam meros obstáculos, prejudicando
a fluidez do enredo e afastando o espectador da experiência emocional que o filme deveria
proporcionar.
O roteiro também falha em entregar o que promete. Embora a premissa indique uma trama
poderosa e cheia de nuances, a construção da história é rasa e incapaz de explorar as
questões propostas de maneira eficaz. A narrativa parece sempre à beira de algo
grandioso, mas nunca consegue atingir esse objetivo. A falta de desenvolvimento adequado
das personagens e da trama impede que o público se conecte emocionalmente, resultando
em uma experiência frustrante e vazia.
A performance de Karla Sofía Gascón, que interpreta Emilia Pérez / Manitas Del Monte, é
um dos poucos pontos positivos da obra. Ela é capaz de conferir alguma profundidade à
sua personagem, mas, infelizmente, a jornada de Emilia – que envolve o processo de
autodescobrimento e aceitação – carece de uma construção emocional mais sólida. Sua
transformação acontece de forma abrupta e sem o desenvolvimento necessário, o que torna
difícil para o público se identificar com sua trajetória. A falta de uma exploração mais rica da
sua jornada de autoconhecimento enfraquece a proposta central do filme.
Quanto ao elenco coadjuvante, Zoë Saldaña, Selena Gomez, Adriana Paz e Édgar Ramírez
não conseguem salvar o filme. Apesar do indiscutível talento de Saldaña, sua personagem,
Rita Moro Castro, se vê limitada por um desenvolvimento superficial e falho. A advogada,
que, em teoria, deveria ser uma força motriz na trama, acaba se tornando um elemento
inexpressivo. Selena Gomez, embora traga algum frescor ao elenco, interpreta Jessi Del
Monte, uma personagem que nunca é suficientemente aprofundada para deixar uma marca.
Por fim, Édgar Ramírez e Adriana Paz, com suas atuações competentes, não conseguem
agregar nada significativo à trama, limitando-se a papéis secundários que apenas
preenchem o espaço, sem fornecer a substância necessária à história.
Uma das maiores falhas do filme é a abordagem superficial das questões de identidade de
gênero e da cultura mexicana. Em vez de criar uma reflexão genuína e profunda, Emilia
Pérez se perde em estereótipos e abordagens superficiais. A representação da mulher trans
e da cultura mexicana acaba sendo rasa e não consegue trazer à tona a complexidade
dessas experiências. Em vez de proporcionar uma verdadeira reflexão sobre esses temas,
o filme se limita a um tratamento que não faz justiça à profundidade e às nuances das
questões que tenta abordar.
Emilia Pérez surge com a promessa de ser uma obra provocadora e reveladora, mas, ao
longo de sua execução, se dissolve em um mar de incertezas. A fusão de gêneros mal
explorada, o roteiro superficial e atuações que não conseguem dar vida à complexidade das
personagens resultam em um filme fragmentado e desiludido. O que poderia ter sido um
mergulho profundo nas questões de identidade e cultura se transforma em uma sequência
de momentos dispersos, sem a intensidade que a trama exige. Em vez de deixar uma
marca duradoura, Emilia Pérez falha em cumprir suas próprias promessas, deixando um
vazio onde deveria haver reflexão e emoção genuínas. O resultado é um filme que, mesmo
carregando um enorme potencial, perde-se em sua própria falta de foco e direção, deixando
no espectador a sensação de que, de fato, poderia ter sido muito mais.

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