
Patrick de Jongh, compositor e supervisor de som do filme, explica como a sonoplastia das cenas de tiroteio foram construídas do zero para gerar maior impacto na audiência
São Paulo, 24 de agosto de 2022 – O thriller de ação “Cano Serrado”, que marca o último filme do ator Rubens Caribé, estreia nas telonas nesta quinta-feira (25) e traz um diferencial importante para o cinema brasileiro, com uma ousada técnica de design e mixagem de som, realizada pelo compositor e supervisor Patrick de Jongh. Inspirado no trabalho realizado no aclamado vencedor do Oscar “Onde os Fracos Não Têm Vez”, o artista desenvolveu toda a sonoplastia do zero, sem a reprodução de efeitos sonoros prontos, normalmente utilizados por profissionais do ramo no Brasil.
“Eu estava vendo algumas referências para entender como ia fazer o design de som do filme e assisti Onde os Fracos Não Têm Vez, dos Irmãos Coen. Logo no início há um tiro de espingarda que ressoa por entre os morros e a sua reverberação é incrível e cheia de cores. Você consegue se imaginar na cena só pelo eco que o estrondo faz. Essa era a visão que tinha para os disparos de armas de fogo presentes no filme, diante daquele cenário árido do cerrado. O objetivo era criar algo especial e único para o suspense. Queríamos tiros menos secos e mais reverberados, que pudessem criar aquela sensação de solidão dos personagens em meio a uma região tão escassa”, explicou Patrick de Jongh.
A fim de proporcionar uma experiência mais visceral e palpável para a audiência, de Jongh e o cineasta Erik Castro se uniram para fazer de Cano Serrado um Sicário brasileiro, um filme de ação extremamente realista, que refletisse o contexto brasileiro. “Erik não apenas dirige longas policiais, ele tem vivência nesse meio. Muitas histórias e personagens são diretamente inspirados em policiais e soldados amigos e conhecidos do diretor. Tudo isso, aliado a esse complexo trabalho de sonoplastia, faz com que a produção gere um impacto muito maior na audiência”, ponderou o compositor e supervisor de som.
Patrick foi ainda mais além e detalhou como a captação das cenas de tiroteio foi realizada, contando com o uso de 12 armas diferentes e 400 balas, além da ajuda e amparo do instrutor de tiro da polícia, Lidenberg Melo. “Há uma sequência de tiros que foi filmada de dentro de um carro. Nós não tínhamos nenhum efeito sonoro que destacasse o som das balas do lado de dentro do veículo e por isso decidimos fazer esse trabalho. Para isso, comprei uma carcaça de um carro, levamos ao campo de tiro e colocamos vários microfones dentro dele, para que pudéssemos captar as balas entrando e atravessando toda a estrutura. Isso nos garantiu uma cena muito mais agressiva e vívida”.
Cano Serrado foi mixado na maior casa de pós-produção de áudio da América Latina, a empresa Tauro – conhecida por ter trabalhado no vencedor do Oscar “O Segredo dos Seus Olhos”, bem como no indicado à estatueta, “Relatos Selvagens”.
Trilha sonora com riffs de guitarra e referências indígenas
Para que o design de som e a trilha sonora se comunicassem bem, Patrick de Jongh também realizou um intenso trabalho de campo com policiais de diversos segmentos, visitando quartéis, delegacias e viaturas para compreender qual era o universo musical que os rodeava.
“Ao entrevistá-los, descobri que o Rock era um gênero predominante tanto no lazer, bem como no dia-a-dia em ação pelas ruas. Bandas como Korn, Led Zeppelin e Rammstein apareceram muito nas listas. Pensando nisso, achei que seria fundamental dar vida às emoções dos protagonistas a partir de riffs super graves na trilha sonora. Isso nos garantiu o realismo necessário, a ponto de até gerar uma certa inquietação na audiência”, comentou o artista.
Outro elemento fundamental da trilha tem a ver com a narrativa da história, que traz uma espécie de embate entre “tribos policiais” – municipal e estadual. Para construir essa atmosfera de constante confronto e tensão, Patrick trouxe referências indígenas para agregar ao rock pesado.
“A levada indígena foi inspirada na dança dos Wawi e maracas e chocalhos foram utilizados para criar esse efeito. Para fechar a parte dominante da trilha, usei 32 violoncelos, além de contrabaixos – que trazem o tom sombrio e pesado, acompanhado de uma espécie de orquestra de trompetes, realizada por Moisés Alves. Quase desafinados e imitando buzinas de caminhões, essa combinação realizada pelo trompetista remete ao torpor e à perda da razão, que naturalmente dá vazão à violência. Além disso, os sintetizadores tiveram um papel crucial, trazendo uma maior contemporaneidade para a trilha. Tudo isso foi feito para que o público possa se sentir dentro da história – vivendo toda aquela tensão”, concluiu de Jongh.