Decisão judicial obriga o estado goiano a encaminhar os 166 presos da unidade prisional para outras cadeias do município. Iniciativa do conselho comunitário e do Ministério Público para construção de nova estrutura esbarra em cobrança de imposto
Em 10 dias, os 166 presos da cadeia de Cristalina, município goiano a 132km de Brasília, serão transferidos para outras unidades prisionais. A Vara Criminal da cidade acolheu a ação civil do Ministério Público de Goiás e determinou a interdição total do presídio devido a riscos de fuga, rebeliões e motins, além da falta de estrutura do presídio para abrigar os internos e ameaça à segurança deles e de servidores. A Justiça também impede que novos apenados sejam acolhidos na estrutura.
Se a decisão judicial de desativar a cadeia for descumprida, o estado vizinho ao DF pode receber multa de R$ 50 mil por dia. No episódio de fuga mais recente registrado na unidade, em 27 de maio, 18 homens escalaram o muro e escaparam da prisão. Alguns chegaram a embarcar em um carro que dava cobertura na porta da cadeia. Outros correram para não serem capturados. Até ontem, forças policiais resgataram nove dos 18 fugitivos.
Ao Correio, o juiz responsável pela decisão, Carlos Arthur Ost Alencar, reforçou que a unidade não reúne condições para funcionar como presídio. “As paredes não têm estrutura adequada, assim como a laje, que propicia as fugas. A última não foi um episódio isolado. O próprio Ministério Público apresenta questões que evidenciam insalubridade, falta de condições do prédio e perigo social”, alertou.
Para o magistrado, o ideal é que os presos sejam transferidos para unidades próximas à Cristalina, o que também esbarra na superlotação. As cidades perto do município são Luziânia, Cidade Ocidental e Valparaíso, mas um relatório de 2015 demonstrava que, àquela época, as cadeias operavam com 396,29%, 233,33% e 68,75% acima da capacidade, respectivamente. Os percentuais constam no Relatório de Inspeção dos Presídios de Goiás, feito pelo Tribunal de Justiça de Goiás e pela Corregedoria Geral de Justiça de GO. “A alternativa é o estado procurar outros presídios com condições de capacidade e que sejam próximas da unidade prisional de Cristalina para possibilitar a visitação de familiares”, ressaltou o juiz.
Manteiga
O promotor de Justiça responsável pela ação, Ramiro Carpenedo Martins Netto, considera que há uma sequência de omissão por parte do estado. “Em 2013, havíamos ajuizado uma ação pelo histórico de fugas, rebeliões e motins que geraram, inclusive, homicídios. Esse é um problema antigo, que, mesmo com o processo transitado em julgado, o estado não avançou para solução desses pontos”, alegou.
Segundo ele, o conselho comunitário, ao lado de representantes do Ministério Público e do Tribunal de Justiça, arrecadou recurso para construção de outra unidade. Há, em caixa, mais de R$ 1,1 milhão, mas com a previsão de chegar a R$ 2 milhões devido a valores ainda não depositados. De propriedade do município, o lote será doado à construtora à frente da obra.
O governo, porém, cobra mais de R$ 13 mil de Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD). “O estado se recusa a dar a isenção do imposto, o que reflete uma completa omissão, aliada à postura impeditiva da nova unidade prisional sair do papel. A comunidade, por conta própria, está tomando a responsabilidade do governo, com doação de mais de R$ 30 mil por parte de algumas pessoas, e o único responsável por isso está de braços cruzados”, enfatizou o promotor.
Na opinião de Ramiro, a cadeia de Cristalina começou a ser constituída de forma equivocada. Antes, as instalações abrigavam uma fábrica de laticínios. “Não se pode brincar com o sistema penitenciário e achar que uma fábrica de manteiga vai segurar presos perigosos, próximos a Brasília, e com divisa com Minas Gerais. A verdade é que os presos de Cristalina não fogem porque não querem”, acrescentou.
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