Praças do Distrito Federal são adotadas e revitalizadas por moradores

Ações nesses espaços são desenvolvidas pela vizinhança em regiões administrativas como Águas Claras, Samambaia e Núcleo Bandeirante

 

ansados de esperar providências do poder público, moradores de diferentes regiões administrativas decidiram arregaçar as mangas e revitalizar por conta própria pracinhas no Distrito Federal.

Segundo o professor aposentado Gilvaldar Monteiro, 75 anos, quando o trabalho originalmente atribuído ao Estado não chega de forma satisfatória ao cidadão, a alternativa é colocar a mão na massa. É o que ele — com a ajuda de outros residentes das ruas 30 e 31 Sul, em Águas Claras — faz na Praça Colibri, localizada em frente aos residenciais Deborah Cristina e Bouganville.

Há pouco mais de três anos, eles adotaram o espaço e, desde então, promovem revitalizações e benfeitorias, mesmo sem receberem um centavo por isso. A falta de interesse em zelar pelos locais, segundo Monteiro, não se resume a um governo específico: todas as gestões fazem pouco caso.

“A praça sempre foi um ponto de encontro de gente que cria cachorros. Com muitas fezes espalhadas e sem limpeza, a visitação ficou impraticável. Foi quando sugerimos que os próprios frequentadores participassem da higienização”, relatou Gil, como é carinhosamente conhecido pelos vizinhos. Ele lidera a iniciativa e é um dos representantes da Associação dos Moradores do Entorno da Praça Colibri (AME).

“Depois, começamos a juntar recursos e compramos tintas e instrumentos para tentar melhorar a aparência do espaço de lazer do bairro. Temos, hoje, cerca de 12 colaboradores ativos. Gente que contribui como pode: seja com pintura de pneus que servem de jardineiras, manutenção dos bancos, plantação de árvores, serviço de jardinagem e até água para molhar as plantinhas”, enumera.

Gil contou que a Praça Colibri é muito utilizada pelos vizinhos — vários deles da terceira idade e crianças. “A reestruturação aconteceu com a participação da comunidade. Dessa forma, todos ficam mais animados e criam afinidade com o local. A ideia é fazer as pessoas realizarem um trabalho comunitário”, complementou.

A professora Maria das Graças da Conceição, 69, é moradora do condomínio Bouganville e varre espontaneamente o espaço todos os dias pela manhã. “Faço daqui a minha sala de visitas e quero que os meus amigos compareçam. Antes, tínhamos muita preocupação com a presença de usuários de drogas e a depredação da praça. Com o bom estado de conservação, acredito que afastamos a negatividade.”

Agora, a demanda do grupo é por água na região. “Reivindicamos, além da limpeza regular, um local para o armazenamento de água. Já solicitamos a intervenção da Caesb e pretendemos ter na praça a instalação de um ponto. O recurso é necessário e nos comprometemos a pagar a conta por meio da nossa associação.”

Situação parecida ocorre na Quadra 205 Sul, também em Águas Claras. Durante anos sem visibilidade e com histórico de degradação, a área, que conta com 100 árvores, está sendo redescoberta graças ao empenho do aposentado José Cezário Menezes de Barros, 76.

De acordo com ele, as mudanças no jardim foram inspiradas na paixão que cultiva por orquídeas e na vontade de ocupar o tempo. Barros é o responsável pela criação do Projeto Nossa Praça (foto em destaque).

De novembro para cá, conseguimos plantar 820 flores. A nossa ideia é que os outros possam vir e plantar também. Como forma de agradecimento e amor, coloco um provérbio em cada uma das árvores, para que as pessoas levem daqui uma mensagem positiva para o seu dia a dia

Ainda segundo o aposentado, o objetivo é que a proposta sirva de exemplo para outras praças, não só da capital da República mas também de todo o Brasil. “Quem não gosta de visitar um local bonito e agradável como esse?”

O administrador Pedro Gomes, 77, ressalta a importância de humanizar a praça. “A intenção de aproximar a população tem dado certo. Muitos vêm porque são atraídos pelas flores e pelos pássaros”, comentou. “O que for necessário para tornar essa convivência possível, nós faremos. Todos os dias troco a água e também colocamos frutas para que as aves venham se alimentar. Faz bem conviver com a natureza. A gente ocupa a mente e se faz útil”, acrescentou.

De acordo com Gomes, o lugar é cuidado exclusivamente por moradores de pelo menos oito condomínios nas adjacências do enderenço. “Nós pagamos uma empresa de jardinagem para fazer a manutenção geral. Toda e qualquer iniciativa parte da vizinhança. O poder público não ajuda em nada.”

Voluntária

Engajada em causas sustentáveis, a projetista Lucy Mendes, 52, residente na Avenida Contorno do Núcleo Bandeirante, decidiu adotar o espaço público nas proximidades do endereço onde vive.

“Me senti incomodada porque sou avó e gostaria que meus netos pudessem ter um lugar para brincar ao ar livre. Eu tinha vergonha de varrer a rua até que, um dia, percebi o vizinho fazendo e aquilo me serviu de exemplo. A minha intervenção é para motivar outras pessoas também.”

Neste caso, a projetista contou com o apoio do Estado, que podou as árvores, cortou o mato e fez a manutenção do parquinho infantil. “Não seria possível sem o poder público. Nós precisamos agir em conjunto. Também comprei tintas e pintei o muro. Improvisei duas lixeiras para restos de cigarros e as batizei de Senhor Quimba e Dona Bituca.”

Lucy comentou que, após dois dias de pintura do muro, no entanto, pichadores foram vistos no endereço. “Fiquei frustrada, mas a solução para isso foi olhar e pensar comigo mesma: ‘Vou fazer de novo’”, ponderou.

Apesar do projeto e da transformação evidente da área de lazer, ainda há muito trabalho pela frente. Aos poucos e sem dinheiro público, as calçadas no entorno da praça precisam ser refeitas. Os planos ainda incluem um “parcão” para cães. “Isso aqui está longe do que nós merecemos e do que nossos impostos pagam. Tem um projeto maior. Existe um abaixo-assinado com a demanda que será entregue à administração regional, mas ainda aguardamos o retorno sobre esse ambiente novo.”

Samambaia

O casal de aposentados Luiz Carlos Nogueira Ferreira, 67, e Irenice Sobreira Alves, 63, mora há mais de 20 anos na QR 410 de Samambaia Norte. Desde que se mudaram para o local, eles cuidam do logradouro que contempla conjuntos residenciais da região.

O espaço público localizado em frente ao imóvel deles recebe frequentemente visitas de motoristas que estacionam em cima do meio-fio e depredam a calçada da pequena pracinha.

“Tem gente que encosta o carro na praça. As pessoas precisam se conscientizar. Isso é um espaço para a vizinhança e para as crianças. Outros trazem cachorros e os animais acabam fazendo xixi e fezes aqui, mas ninguém limpa depois. Nós cuidamos, cortamos a grama, tentamos manter sempre em bom estado para o uso, mas ainda necessitamos de mais atenção ao local para recuperá-lo por completo”, frisou.

Para atender a demanda de lazer e dar nova cara ao local com o intuito de unir a comunidade, Luiz Carlos disse ter solicitado ao governo a instalação de dois bancos, além da reconstrução da calçada.

Precisamos desse olhar cuidadoso. Isso é algo que pode ser aplicado tanto aqui como em outras praças da cidade. O custo não seria elevado. Se tivermos um modelo funcionando, no qual a gente possa participar apenas com a manutenção diária, a plantação de flores e a limpeza, isso nos traria mais qualidade de vida

IRENICE SOBREIRA ALVES

O outro lado

O Governo do Distrito Federal (GDF) lançou, em maio deste ano, o programa Adote uma Praça, iniciativa para promover parcerias entre empresários e moradores na manutenção e recuperação desses espaços.

O programa permite que pessoas físicas e jurídicas firmem termo de cooperação e ajudem na manutenção de áreas verdes da capital. O interessado procura a administração regional e protocola requerimento de adoção que, posteriormente, será encaminhado à Secretaria de Projetos Especiais (Sepe). A partir daí, todos os estudos e caminhos a serem percorridos são conduzidos com o aval de técnicos.

De acordo com a Sepe, responsável pela iniciativa, o primeiro adotante, o Hospital Brasília, deve concluir as obras do terreno adjacente à sua propriedade em breve. Outro pedido, feito pela Escola das Nações, no Lago Sul, para adotar locais em volta da área da instituição de ensino, está em análise pelo GDF. “Ademais, outras solicitações foram recebidas e estão em fase de avaliação para enquadramento das diversas alternativas apresentadas”, esclareceu a pasta.

Ainda segundo o GDF, o trabalho é feito com critério, pois envolve outros órgãos do governo e leva em conta questões como acessibilidade e cuidados com o meio ambiente. O programa engloba, além das praças, vários outros tipos de logradouros, entre os quais estão jardins, parques infantis, áreas verdes e Pontos de Encontro Comunitários (PECs) – todos esses espaços de uso livre da comunidade.

“O programa não tem fins lucrativos para os adotantes. Conforme estabelece o decreto que o instituiu, procura incentivar o trabalho em conjunto de pessoas físicas e jurídicas que tenham interesse em adotar essas áreas por um período determinado. Assim, quem firmar o termo de cooperação poderá instalar placa com mensagem indicativa de que é o adotante do espaço.”

anúncios patrocinados
Anunciando...

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.