Os desafios do planejamento urbano: regularizar terras e combater déficit habitacional

Como o Plano Estratégico do GDF quer garantir qualidade de serviços públicos e reduzir as distâncias sociais e econômicas na habitação

Inovar na política de planejamento territorial, ter maior efetividade com a regularização fundiária e combater o déficit habitacional são desafios que precisam ser enfrentados pelo GDF para que a capital federal chegue ao seu centenário atendendo as demandas atuais da população – e, também, as necessidades das gerações futuras. Essas são três prioridades estabelecidas no eixo desenvolvimento territorial do Plano Estratégico do Distrito Federal 2019-2060 (PED-DF), lançado em maio.

A dinâmica territorial do Distrito Federal envolve não apenas a área planejada e reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, mas todas as regiões administrativas e a Região Integrada de Desenvolvimento do DF e Entorno (Ride).

Para atuar de forma efetiva no desenvolvimento territorial, o Estado precisa garantir qualidade na prestação de serviços públicos e reduzir as distâncias sociais e econômicas da população. Para tanto, deve analisar integralmente a oferta de serviços públicos nos territórios, envolvendo habitação, mobilidade e sua infraestrutura, energia e iluminação pública, saneamento básico, até alcançar saúde, segurança, educação.

Pelo  PED-DF, o direito à moradia e regularização fundiária são necessidades básicas que precisam ser supridas pelo governo. E as políticas de regularização fundiária e de acesso à moradia são debates históricos no DF, desde a transferência da capital para a região Centro-Oeste, quando as terras que integram o quadrilátero não foram desapropriadas em sua totalidade.

Proliferação de condomínios

Hoje, um terço da população do DF mora em áreas irregulares, sem escritura das suas casas. Tanto pela proliferação dos condomínios nos anos 90 quanto pela criação de assentamentos promovidos por governos passados – que não os dotavam de toda a infraestrutura e licenciamento ambiental, e que acabaram tornando cidades, como São Sebastião, Samambaia e Paranoá.

Desde a construção de Brasília, a busca por oportunidades incentivou fluxos migratórios para o DF, com o consequente adensamento populacional além do planejado.

O alto custo da habitação na região central e as grandes distâncias entre os centros habitacionais e econômicos motivaram a invasão de terras e a proliferação de moradias precárias, fatores que contribuíram para que o Distrito Federal ocupe a quinta pior posição no déficit habitacional do país, ficando atrás apenas do Maranhão, Amazonas, Roraima e Amapá.

Déficit habitacional

Segundo estudo da Fundação João Pinheiro, publicado em 2018, seria necessário aumentar em 14% a oferta de domicílios no DF para sanar a carência de moradia da população.

O déficit habitacional é causado por dois fatores: o ônus excessivo com aluguel e a quantidade de famílias que dividem o mesmo domicílioFrederico Poley, coordenador da pesquisa sobre o déficit habitacional

Poley diz considerar como ônus excessivo famílias que ganham até três salários mínimos e gastam mais de 30% com aluguel. “E como o aluguel em Brasília é caro, esse número é alto”, ressalta. “Além disso, o saldo migratório do DF ainda é positivo.”

Até o fim do ano, o GDF vai entregar 2.360 unidades habitacionais. O primeiro projeto será a quadra 700 do Sol Nascente, com previsão de entrega de 132 unidades em agosto e mais 176 em dezembro.

Depois vem o Setor Crixá, em São Sebastião, com 1.904 unidades habitacionais que serão entregues em outubro e novembro; e dois residenciais em Samambaia com previsão de entrega em novembro.

O governo também pretende acelerar as obras do Residencial Vale da Bênção, no Recanto das Emas, que estava parado, e vai oferecer 24 mil unidades habitacionais. Além disso,  famílias já estão sendo chamadas para serem habilitadas para o Itapoã Parque, que, em dois anos, vai oferecer 12 mil apartamentos.

110 milé a quantidade de famílias do DF inscritas na Codhab à espera da casa própria

O Plano Estratégico do Distrito Federal 2019-2060 está dividido em quatro etapas temporais. As primeiras ações já devem ser iniciadas este ano e envolvem medidas como redução do desemprego, aumento da competitividade do DF, aumento da disponibilidade de medicamentos para a população e redução de mortes no trânsito.

A segunda abrangência vai de 2020 a 2023. Nesse período serão destacadas as políticas públicas que estão sendo elaboradas pelo governo. O terceiro foco do plano vai de 2024 a 2030. Nesta fase, a intenção é contemplar a Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O foco temporal de longo prazo está delimitado ao período de 2031-2060, englobando as tendências do futuro rumo ao centenário de Brasília.

Assim, até 2023, estão previstas a entrega de 25 mil unidades habitacionais – bem como a implantação do Programa Locação Social, para redução do déficit por ônus excessivo com aluguel, e do o Plano Distrital de Habitação de Interesse Social.

O GDF também vai realizar melhorias em mil unidades habitacionais de famílias de baixa renda e ampliar em 20 mil unidades a oferta de lotes urbanizados para a Habitação de Interesse Social.

Planejamento territorial

A necessidade de expandir a oferta de habitações pressionará pela alteração dos critérios urbanísticos, o que agravará o adensamento urbano com a verticalização das moradias e a expansão horizontalizada das cidades.

Assim, inovar na política de planejamento territorial é a principal batalha do eixo desenvolvimento territorial. Para a efetividade dessa estratégia, porém, é necessária a integração da gestão eficiente do território, do monitoramento e do controle social, por meio da atualização normativa e do uso de tecnologias.

Dessa forma, a revisão, aprovação e implementação do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal – PDOT, bem como a regulamentação dos instrumentos do Estatuto das Cidades, criando instrumentos para viabilizar a ampliação da oferta de habitação de interesse social, além do incremento da plataforma tecnológica de monitoramento territorial, são ações que possibilitarão a inovação das políticas públicas de planejamento territorial.

O PDOT, que será revisado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) até 2021, é o instrumento básico da política territorial e orienta os agentes públicos e privados sobre a gestão das localidades urbanas.

Ele aponta, por exemplo, para onde a cidade deve crescer e define áreas como urbanas, passíveis de adensamento populacional, e outras como rurais. Sua revisão é indispensável também para a regularização de vários condomínios, especialmente os que saíram do papel ou se consolidaram na última década.

Para o aprimoramento do planejamento territorial, o Plano Estratégico também prevê a modernização do Observatório Territorial, fortalecer o Sistema de Planejamento Territorial e Urbano (Siplan) e aumentar o número de ações fiscais preventivas nas áreas de monitoramento prioritário.

Regularização fundiária

Ter maior efetividade com a regularização e os novos parcelamentos em áreas definidas pelo ordenamento territorial é a 2ª batalha do eixo desenvolvimento territorial – que tem por objetivo a realização de ações de regularização fundiária.

Isso compreende a redução para 30 dias do tempo de análise dos projetos de regularização fundiária e novos parcelamentos, assim como o aperfeiçoamento da respectiva base legal e o aumento das áreas rurais regularizadas de 30% para 70%.

Para vencer essa batalha, o GDF também vai entregar 100 mil escrituras públicas de Áreas de Relevante Interesse Social (Aris) e 15 mil de Áreas de Relevante Interesse Específico (Arine). Como em Vicente Pires, a maior ocupação irregular de interesse específico do Brasil, com uma população de mais de 80 mil habitantes.

Para viabilizar a regularização de Vicente Pires, o GDF dividiu o setor habitacional em quatro trechos. Dois deles – o Jóquei Clube e a antiga Colônia Agrícola Samambaia – são propriedade da Agência de Desenvolvimento do DF (Terracap) e estão vendidos aos atuais moradores que, depois da venda direta, terão as escrituras dos imóveis.

José Newton dos Santos Morais, 52 anos, mora com a mulher e a filha de 6 anos em um dos condomínios do Jóquei. Ele comprou a casa por R$ 600 mil em 2016 sabendo que o terreno era irregular, mas acreditando na regularização.

A regularização nos dá tranquilidade e vai valorizar nossos imóveisJosé Newton dos Santos, morador do Jóquei Clube Morais, morador

Agora, o lote foi incluído no edital de venda direta publicado pela Terracap e ele aderiu ao processo. Vai pagar R$ 80 mil pelo terreno para ter o imóvel regularizado. “Na época paguei os R$ 600 mil à vista. Depois da escritura, as pessoas poderão financiar caso eu decida vender”, diz.

 

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