30 mil moradores
Hoje, já vivem nessas terras do Grande Colorado, que equivalem a duas vezes o tamanho do Guará, 30 mil moradores distribuídos por 54 condomínios. Na maioria das negociações, os lotes foram adquiridos entre as décadas de 1980 e 1990.
O edital questionado por moradores tem como base mediação conduzida pelo Governo do Distrito Federal (GDF), iniciada em janeiro e que teria sido concluída em uma reunião de 31 de maio de 2019.
“Quando nós fomos chamados para acompanhar a mediação, chamava-se o valor de despesa para regularização. Iria ser só realmente custo de compensação ambiental, eventuais urbanísticas, e agora, como mostra o contrato, tenta transformar o valor de regularização na compra da propriedade”, acrescentou a advogada da AMGC, Maria Olímpia, que também defende 14 condomínios em ações de usucapião em andamento na Justiça.
Em 12 de julho, noticiamos que desde que o governo chancelou e publicou as regras para o pagamento das glebas à Urbanizadora Paranoazinho, os residentes passaram a sofrer uma pressão constante de funcionários da empresa interessada no negócio.
Muitos relatam receber, em um só dia, dezenas de ligações de representantes da administradora. Nas conversas, os agentes fazem um trabalho maçante no sentido de convencer o grupo de que, caso não se renda à conciliação, corre o risco de perder as terras.
Os canais de pressão são variados: os avisos chegam por cartas, e-mails, carros de som e até mesmo em eventos. Munidos de megafones, os porta-vozes da Paranoazinho propagam a ideia de que os moradores não podem perder a chance de “legalizar” seus lotes.
A UP preferiu não se manifestar sobre a carta.
Conciliação
Ao recusar liminar requerida por três condomínios para anular o edital que contém as regras para o negócio, o juiz marcou audiência de conciliação entre a empresa, moradores e o GDF. No último dia 16, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) informou que, “diante da complexidade” envolvendo a regularização do Grande Colorado, tem recebido manifestações por meio da Ouvidoria ou em contato pessoal nas quais cidadãos dão seus relatos sobre o processo. Como é uma briga entre particulares, contudo, o órgão nada pode fazer na maior parte dos casos.
A Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) tem atendido os moradores e avaliado individualmente cada situação. Em nota, a unidade informou existirem também ações judiciais que chegam para pronunciamento ministerial.
Entenda
A papelada revelada mostra que os residentes do Grande Colorado, em sua maioria, compraram e pagaram pela terra vendida por Tarcísio Márcio Alonso, que chegou a ser condenado e preso por grilagem de terras no Distrito Federal e em São Paulo. Aponta, ainda, que ele revendeu os mesmos quinhões para a atual Urbanizadora Paranoazinho, uma sociedade anônima criada exclusivamente para gerir o bilionário negócio, cuja participação dos empresários José Celso Gontijo e Rafael Birmann veio à tona.
O GDF entrou na história quando o atual governador, Ibaneis Rocha (MDB), conduziu uma tentativa de conciliação em que, publicamente, defendeu o pagamento à administradora. Chegou a se exaltar com os síndicos inconformados diante dos valores propostos pela Urbanizadora Paranoazinho, de, em média, R$ 120 o metro quadrado.
O governo, inclusive, disponibiliza linha de crédito do Banco de Brasília (BRB) para financiar em até 100% a dívida dos residentes da localidade.
Desde que o GDF chancelou e publicou as regras para o pagamento das glebas à Urbanizadora Paranoazinho, os ocupantes delas que ainda não aderiram ao acordo passaram a sofrer uma pressão constante de funcionários da empresa interessada no negócio, que pode render lucro de R$ 12 bilhões.
Muitos relatam receber, em um só dia, dezenas de ligações de representantes da administradora. Nas conversas, os agentes fazem um trabalho maçante no sentido de convencer o grupo de que, caso não se renda à conciliação, corre o risco de perder as terras.
O que diz a Urbanizadora Paranoazinho
Embora não tenha se manifestado sobre a carta dos moradores e o fato de a Justiça ter determinado a realização de audiência de conciliação, no último dia 11, data da primeira reportagem mostrada, Ricardo Birmann, presidente da Urbanizadora Paranoazinho, afirmou que a empresa sempre atuou com “responsabilidade, transparência e preocupada com a segurança jurídica”. “Desde que assumimos, temos uma postura de muito rigor. A área estava imersa neste universo de insegurança. Iniciamos o maior processo de regularização fundiária da história”, pontuou.
Birmann reconheceu a participação de José Gontijo no quadro societário da urbanizadora, mas nega a interferência de Tarcísio nos negócios. “Ele tem dinheiro a receber, mas não participa ativamente das decisões”, explicou.
A Urbanizadora Paranoazinho também informou, por meio de nota, que “Tarcísio Márcio Alonso, assim como cerca de 60 outros herdeiros, advogados e cessionários, tinha direitos ao espólio de José Cândido de Sousa, antigo proprietário das terras que compõem a Fazenda Paranoazinho. A partir de 2008, a UP negociou e adquiriu toda a área por meio de inúmeras negociações com esses diferentes herdeiros/cessionários, sempre tomando as precauções legais, sempre por escrituras públicas e sempre com registro em cartório de registro de imóveis”.
O que diz a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação
Também por meio de nota enviada no último dia 11, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) sublinhou que “o quadro societário da empresa trata-se de matéria de cunho exclusivamente relacionado à Urbanizadora, sobre o qual à secretaria não cabe qualquer juízo, competindo-nos tão somente, nessa fase, a continuidade na análise e aprovação dos projetos urbanísticos a serem encaminhados com base nos critérios estabelecidos entre os particulares envolvidos”.
Sobre a participação do governo na negociação entre terceiros, a pasta destaca ter realizado “a mediação do conflito fundiário que já durava mais de uma década, entre a UPSA e os moradores da região, garantindo a participação de quaisquer interessados em todas as reuniões realizadas, buscando sempre uma solução para a questão fundiária, sobretudo com vistas à efetiva regularização da região”.
“Por fim, importante ressaltar que a adesão à proposta apresentada pela Urbanizadora Paranoazinho não é obrigatória, tratando-se de faculdade dos moradores para que, além de encerrar a discussão quanto à propriedade, a empresa assuma todos os custos inerentes ao processo de regularização legalmente estabelecido, incluídos todos os estudos e compensações necessários, como ambiental e urbanístico, bem como as obras de infraestrutura mínimas previstas para a região e ainda não executadas”, conclui o texto.