Existe uma tecnologia anticorrupção, só precisamos parar para usá-la

Mais conhecido no Brasil como o sistema por trás das criptomoedas, o blockchain já tem sido usado em outros países para diversas finalidades, que vão desde o setor de energia até o de alimentos. Por aqui, essa tecnologia ainda caminha a passos lentos, mas bem que poderia ser uma importante aliada no combate aos desvios de verbas públicas. Quem diz isso é Tatiana Revoredo, professora do Insper, representante do European Law Observatory on New Technologies no Brasil e especialista em blockchain pela Universidade Oxford e pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology).

Devido a características como transparência e imutabilidade, o blockchain pode ser um divisor de águas na luta anticorrupção no Brasil.

O conceito do blockchain apareceu pela primeira vez em 2008, na crise econômica mundial. Foi uma forma de aumentar a confiança das operações financeiras, evitando gastos duplos e garantindo uma validação descentralizada das transações.

A internet massificou a distribuição da informação, mas, do modo como funcionava, não permitia a distribuição segura de valores sem um banco no meio. Com o blockchain, essa transferência acontece sem intermediários, com dados criptografados e arquivos que não podem ser alterados (apenas atualizados), sendo que com todo o caminho percorrido entre o começo e o fim de uma operação passa a ser registrado.

Desta forma, forma-se uma grande base de dados pública, compartilhada e universal –e tem coisa mais atraente para quem quer combater desvios de dinheiro público do que isso? O sistem do blockchain possui peculiaridades que blindam ataques ou interferências no meio do caminho.

“Como há vários computadores validando uma transação, a informação é transparente, e os hackers não conseguem atacá-la em um ponto único”, explicou a especialista em entrevista a Tilt.

Agora, resta convencer os envolvidos no jogo de que os velhos mecanismos precisam ser substituídos por tecnologias que dão menos brechas para desvios e corrupção, no setor público ou no privado.

Para transações comerciais, os usos também são infinitos e servem para combater, além de desvios de dinheiro ou práticas de corrupção, adulterações, mão de obra contratada de forma abusiva, matérias-primas de origem duvidosa, entre outras coisas.

Países como a China, por exemplo, já usam o blockchain para rastrear alimentos. Desse modo, o comprador tem garantia da origem, de como foi produzido e se ele está de acordo com as normais locais.

Isso é importante em cadeias como a do atum, em que a qualidade da carne está associada ao local em que o peixe foi criado. No caso dos grãos, essas informações podem indicar com precisão se eles são transgênicos ou orgânicos. Já em cadeias como a do cacau, a tecnologia pode certificar que não há trabalho escravo na produção.

Na área da saúde, o sistema pode servir para facilitar o envio de prontuários ou exames de um serviço para outro. “Isso possibilita que seus registros médicos fiquem com você, que disponibiliza para quem quiser, sem precisar se deslocar”, diz a especialista. Por aqui, já há iniciativas de empresas e órgãos públicos nesse sentido. Uma das ações mais recentes veio do Rio Grande do Norte, que se tornou o primeiro Estado do Brasil a usar o blockchain para a certificação digital de empresas. “Isso faz com que as companhias ganhem tempo e dinheiro no processo”, diz a especialista.

A Petrobras anunciou que pretende usar a ferramenta para otimizar a cadeia logística de suprimentos de peças. Isso será feito a partir da instalação de sensores no fluxo do óleo, o que vai garantir suas propriedades ao longo do processo e pode significar ganhos de 30% para a companhia. A previsão é que ela esteja disponível em dois anos. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), por sua vez, prevê o uso do blockchain para minimizar fraudes e aumentar transparência de verbas públicas. Isso é possível porque foi criada uma espécie de identificação digital das transações, o que facilita o rastreamento de quem, quando e onde os dados foram inseridos e como eles chegam ao destino. A tecnologia, no entanto, está em fase de testes.

Apesar dos exemplos, Revoredo diz que no Brasil falta mão de obra especializada e uma mudança de foco das discussões políticas sobre esse sistema. “Aqui ainda estamos pensando muito regulação, tentando definir o que é blockchain, mas acho que precisamos de ampliar os conhecimentos, ou vamos ter que comprar tecnologia de fora”, afirma. “As iniciativas existem, mas é muito incipiente se comparado a outros países”, avalia ela.

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