As tendências de investimento em ESG: Um caminho acidentado, mas promissor

 

A consultora Control Risks, uma das maiores players do mercado mundial de análise de riscos e com atuação mundial, traz as tendências de investimento em ESG no Brasil sob o comando do presidente Jair Bolsonaro com base em seus últimos discursos em relação às mudanças climáticas, após crescente pressão para que o Brasil revisse suas políticas ambientais.

Pontos principais: 

  • A administração Bolsonaro continua sem um plano claro e uma vontade política genuína para perseguir metas ambientais ambiciosas.

  • As preocupações dos atores internacionais sobre a política ambiental do Brasil serão obstáculos significativos, mas não empecilhos para o desenvolvimento de oportunidades ESG (meio ambiente, social e governança) no país em uma perspectiva de dois anos.

  • Com o menor envolvimento do governo, o setor privado terá o desafio e a oportunidade de liderar as tendências sustentáveis no próximo ano. As iniciativas de autorregulação provavelmente se tornarão cada vez mais comuns.

  • As empresas devem esperar um panorama de riscos cada vez mais complexo em meio a esse cenário. Altos níveis de escrutínio pela sociedade civil significam que a integridade e as ameaças operacionais estarão latentes em toda a economia. 

“E” em destaque

Dentre as três categorias que compõem a ESG, a primeira – ambiental – é, sem dúvida, a que mais polêmica no Brasil nos últimos dois anos. 

Resultado direto das políticas ambientais do governo Bolsonaro, que serviram de pano de fundo para aumentos recordes em desmatamento e focos de incêndio – notavelmente, mas não apenas na região amazônica. 

Desde que assumiu o cargo, seu governo – liderado pelo campeão da desregulamentação, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles – colocou as credenciais ambientais do Brasil (antes positivas) em uma trajetória de deterioração.

A pressão interna e internacional só aumentou desde então e o presidente prometeu reduzir as emissões de carbono do Brasil em 43% e eliminar o desmatamento ilegal até 2030 – promessas que foram recebidas com profundo ceticismo por ambientalistas, considerando o histórico do governo sobre o assunto.

Falar é fácil

Embora as promessas de Bolsonaro feitas estejam amplamente alinhadas com os compromissos de descarbonização em outras partes do mundo, elas representam uma reviravolta significativa em relação à política ambiental real implementada desde que ele assumiu o cargo em 2019 – levantando preocupações sobre o grau em que suas palavras serão traduzidas em ação.

O desmatamento é responsável por mais de 50% das emissões de carbono do Brasil, de acordo com várias fontes, e os esforços do governo para reverter os esforços de conservação levaram as taxas de desmatamento a níveis recordes. 

O Instituto Espacial Brasileiro (INPE) informou que pelo menos 11.088 km² de floresta tropical foram arrasados entre agosto de 2019 e julho de 2020 – o maior número desde 2008. Enquanto isso, o órgão ambiental do Ibama aplicou 20% menos multas em 2020 de acordo com suas próprias estatísticas, principalmente devido ao apoio político e recursos insuficientes para as inspeções após cortes consecutivos pelo Bolsonaro.  

As promessas de Bolsonaro para melhorar o cenário ambiental do Brasil provavelmente permanecerão principalmente retóricas, e as empresas não devem esperar que o governo federal conduza mudanças positivas sobre o assunto nas perspectivas de dois anos.

Sem interrupções

Enquanto o governo, portanto, permanece altamente improvável de liderar as questões ASG, outras partes interessadas provavelmente intervirão. Embora o Congresso em 3 de março tenha iniciado as discussões em torno de um projeto de lei que regulamenta o mercado local de carbono; sem o apoio do executivo, a Control Risks espera que esta iniciativa avance lentamente devido a outras prioridades latentes relacionadas ao COVID-19.

  • Os participantes privados provavelmente continuarão a aproveitar a oportunidade de liderar o caminho e definir a agenda em termos de práticas de investimento sustentável em várias frentes – incluindo a ambiental. 

  • As iniciativas em torno de tópicos como neutralidade de carbono, eficiência energética e gestão de resíduos provavelmente serão alguns dos exemplos mais ilustrativos. 

  • Várias empresas, principalmente no setor financeiro, adquiriram voluntariamente no ano passado créditos de carbono para anular sua pegada de carbono – mesmo na ausência de tal estrutura.

  • Práticas de triagem negativa – por meio das quais bancos e fundos de investimento excluem grandes emissores de gases de efeito estufa de uma carteira – também se tornaram cada vez mais comuns, impactando vários setores, como papel e celulose, mineração e produção de carne. 

Em agosto de 2020, os três maiores conglomerados financeiros privados do Brasil anunciaram uma iniciativa com o objetivo de desenvolver um banco de dados compartilhado que os ajudará a identificar e cortar o crédito de empresas com pegadas ambientalmente insustentáveis na Amazônia. 

A triagem positiva, representada por investidores que buscam ativamente ativos sustentáveis, também será uma característica regular do ambiente financeiro, apresentando oportunidades de financiamento para planos de negócios com fortes credenciais verdes. De acordo com a base de dados privada Morningstar, os fundos com essa abordagem dobraram de tamanho em 2020 no Brasil.

Órgãos governamentais com maior grau de independência política e recursos significativos – como o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – também permaneceram ativos em questões ESG e provavelmente continuarão a ser importantes patrocinadores dessa tendência. Nos últimos dois anos, eles atuaram, por exemplo, para aprimorar os padrões de divulgação de sustentabilidade, alinhando-os às práticas internacionais. Isso acabou ajudando a fomentar um mercado promissor de títulos verdes, que o Brasil lidera ao lado do Chile na América Latina, de acordo com dados de 2020 da Climate Bonds Initiative (CBI).

 

 

Embora as entidades relacionadas a finanças provavelmente tenham um papel mais proeminente nas questões ASG, as agências setoriais (como a Agência Nacional de Energia Elétrica, ANEEL) também serão aliadas potenciais para as empresas em sua transição verde. Múltiplas evidências sugerem que seus representantes estiveram de alguma forma envolvidos em discussões internacionais, e a Control Risks avalia que eles provavelmente manterão uma postura favorável ao mercado em tal processo para a perspectiva de dois anos.

Prevalência de risco

Dado o status incipiente de muitas discussões regulatórias relacionadas a ESG e a restrição relativamente reduzida das atuais estruturas regulatórias do Brasil, é improvável que as empresas sejam pressionadas por iniciativas governamentais a tomar medidas mais firmes para lidar com sua pegada ambiental. O escrutínio, no entanto, continuará a aumentar significativamente devido às crescentes preocupações entre as organizações da sociedade civil – incluindo as internacionais – bem como consumidores, financiadores e outras partes interessadas relevantes. Muitas ONGs e ativistas recorrem a iniciativas de ‘nomear e envergonhar’ nas redes sociais, mas os casos também evoluíram para boicotes e até mesmo ações diretas em casos mais sensíveis e notórios no ano passado.

É digno de nota, no entanto, que tal cenário provavelmente evoluirá para um ambiente de risco mais complexo à medida que as agendas ESG avançam na perspectiva de dois a quatro anos. Isso se deve à previsibilidade relativamente reduzida sobre a regulamentação futura (inclusive internacional) e à potencial politização dos debates sobre mudanças climáticas. A pressão persistente de atores internacionais sobre o panorama de sustentabilidade do Brasil significa que os riscos diplomáticos não são desprezíveis e incluem possíveis sanções em setores específicos, como madeira e carne.

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