Uma Universidade terá de pagar R$ 50 mil a um vigia vítima de “racismo recreativo”

Funcionário negro foi comparado à decoração de esqueleto durante confraternização da instituição em que trabalhava

 

Uma universidade em Itaperuna, no Rio de Janeiro, foi condenada a pagar R$ 50 mil por danos morais a um vigia que foi comparado a um esqueleto por colegas de trabalho. Segundo a juíza Bárbara de Moraes Ribeiro Soares Ferrito, que julgou o processo, questões raciais e de classe tornaram a situação mais humilhante. 

Em junho de 2021, o funcionário recebeu uma mensagem, em um grupo de WhatsApp, em que foi comparado, de forma pejorativa, a uma decoração de esqueleto colocada no hall da instituição durante uma festa junina. Fotos foram compartilhadas, gerando comentários que lhe causaram humilhação e impactaram a saúde mental dele de forma negativa, segundo conta na ação. 

O funcionário afirmou que a decoração em questão teria sido montada e posicionada a fim de remeter a ele, inclusive com o bigode dele. A universidade, por sua vez, afirmou que “o esqueleto foi colocado como vigia e, por isso, foi associado” a ele, e que o episódio se tratou de “brincadeira inofensiva por parte dos colaboradores” e de “fato isolado”. 

Depois do acontecido, porém, o autor da ação, que trabalhava desde 2009 na instituição e havia sido promovido à função de vigia em 2020, precisou se afastar do trabalho e fazer acompanhamento psiquiátrico. 

Na decisão, a juíza destacou que, embora, de acordo com perícia, o vigia não sofresse de doença psiquiátrica crônica, esse fator não era necessário para que o acontecimento fosse configurado como assédio moral. Ainda, enfatizou que, devido ao fato de o funcionário, “homem pobre, negro”, ter “baixo status na hierarquia” da universidade, ele não teria capacidade de defesa, o que tornaria o episódio ainda mais humilhante. 

Por fim, ela utilizou do conceito de “racismo recreativo”, pois, ainda que não tenham sido usadas falas racializadas, “o reclamante é um homem negro, o que por si só racializa todas (as) suas relações”. 

“Pelas características apreciáveis em audiência, percebe-se que o reclamante é um homem pobre, negro, sem deficiência, que ocupa cargo de baixo status na hierarquia da ré (a universidade)”, diz a decisão. “Escolheu-se justamente o funcionário com pouco potencial de defesa para rir. Vejam: o alvo não foi o reitor ou o professor titular ou catedrático. Estes poderiam decidir o que fazer com os subordinados espirituosos. Seria uma escolha deles, em razão do status de seu cargo. Não, a brincadeira foi feita com o vigia, que, sem qualquer poder de resistência, só pode sentir a humilhação.” 

“E não foi essa a intenção da brincadeira?”, continua a juíza. “Lembrar o trabalhador que ele pode, de uma hora para a outra, servir de graça para pessoas supostamente mais importantes no quadro hierárquico da empresa? Ser feito de bobo da corte? A intenção foi fazer rir. Daí se presume: ‘uma brincadeira’. Mas às custas de quem se ri?” 

Uma vez que a empresa apenas se desculpou, e, segundo a juíza, um pedido de desculpas não seria suficiente — já que a micro agressão “afeta a relação do indivíduo com o lugar/grupo”, que “passou a ser associado a violência e não mais a promoção da dignidade como deve ser o ambiente laboral” —, foi deferido o pedido de indenização por danos morais em R$ 50 mil, além de pagamento de honorários advocatícios pela ré. 

Tentamos contato e aguarda retorno do Centro Universitário UniRedentor, do grupo de formação de profissionais de medicina Afya, cuja mantenedora, segundo banco de dados do Ministério da Educação (MEC) é a Sociedade Universitária Redentor S.A., ré da ação. 

anúncios patrocinados
Anunciando...

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

This site uses Akismet to reduce spam. Learn how your comment data is processed.