Os Gargalos enfrentados pelo cidadão no INSS e as FRAUDES escandalosas que nunca tem solução! 

Além das fraudes bilionárias com descontos indevidos, problemas só aumentam. Segurados afirmam que aplicativo suprime meses de contribuição, e atualizações cadastrais demoram mais de dois anos para serem corrigidas

 

O escândalo das fraudes bilionárias nos descontos em folha de beneficiários e aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) são apenas a ponta do iceberg dos problemas existentes no órgão, que tem uma “fila invisível” de 2,4 milhões de pessoas que aguardam respostas dos pedidos feitos à instituição até junho deste ano. Essa fila já foi maior, de 2,7 milhões de pessoas em março, mas ainda é elevada se comparada aos 1,3 milhão de junho de 2024, ou seja, salto de 80,4% ou 1,1 milhão a mais, número considerado “absurdo” por especialistas.

Conforme os dados do INSS, desse total de pedidos na fila virtual, menos da metade — 978,5 mil pessoas, ou seja, 40% — aguarda retorno do órgão há menos de 45 dias e o restante, ou seja, a maioria, espera há mais tempo. E esse amontoado de pedidos engavetados nem sempre têm explicações plausíveis do INSS, podendo ter sido resolvidas em menos de 10 minutos.

É o caso de Gilsete Rodrigues de Araújo Bezerra, 69 anos, moradora de Sobradinho, que está há dois anos aguardando resposta do órgão devido a um erro no título de eleitor, que traz a grafia do nome da mãe com um “l” que não existe. Em vez de Virgínia, colocaram “Virlginia”, mas em todos os outros documentos aparece o nome correto. Outro exemplo é o paulista Paulo Nunes, que completou 60 anos em janeiro e foi avisado pelo aplicativo Meu INSS, em abril, que poderia dar entrada no pedido e apresentou toda a documentação, pois estava tudo verde para o pedágio de 100%. Contudo, em junho, o pedido foi recusado, e, para a surpresa dele, o que era verde ficou vermelho, com todas as contagens de três meses de contribuição perdidas. “Mesmo o Meu INSS avisando que eu tinha direito a requerer a aposentadoria pela regra de transição, pagando 100% de pedágio, o INSS me pediu uma série de documentos. Dois meses depois, o INSS me avisou que meu pedido foi recusado. Ora, se o próprio Meu INSS avisou que eu havia cumprido as regras para a aposentadoria, por que tanta exigência de documentos e por que a negativa?”, questiona Nunes.

Advogados reconhecem que problemas e atrasos no INSS são frequentes e, segundo eles, o fato de um órgão público criar entraves para que o cidadão tenha acesso a um direito garantido por lei é uma infração grave de um órgão público e cabe processo contra a União, que pode acabar em novos precatórios (dívidas judiciais).

“Essa demora é uma prática que ocorre em muitos órgãos da administração pública e ela é inconstitucional e ilegal”, alerta o advogado Francisco Zardo, coordenador do núcleo de Direito Público da Dotti Advogados. Segundo ele, além de infringir o inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição, que diz que o cidadão tem direito de ser tratado com celeridade pelo órgão público, que deve facilitar e não dificultar a prestação do serviço, o INSS também não tem respeitado a Lei 9784/1999, que rege a administração federal. “O Estado tem que facilitar a vida do cidadão e não dificultar e impor barreiras”, afirma. Ele critica a digitalização dos processos do INSS que fizeram as filas de pessoas sumirem das agências físicas e, com isso, ampliando a “fila virtual ou invisível”.

“A administração digital não pode ser um obstáculo para o acesso ao cidadão. É para ser um facilitador. O que estamos vendo é um retrocesso, porque o cidadão não tem a senha e não sabe o lugar dele na fila”, critica Zardo. Segundo ele, não há dúvidas de que casos como a demora em mais de dois a três anos de processos administrativos para a atualização de dados de depósitos em juízo de contribuições, por decisão da Justiça Trabalhista, podem ser passíveis de questionamentos na Justiça e que podem se tornar precatórios. “O Estado não pode protelar o reconhecimento de um direito e o cidadão pode impetrar mandado de segurança para que o juiz estabeleça um prazo e, se houver um indicativo de uma má condução sistemática, é preciso uma apuração”, alerta.

O especialista em Previdência Social Arnaldo Lima, chefe da área de relações institucionais da Polo Capital, reconhece que a fila invisível do INSS é um “desafio crônico” e medidas recentes, como a volta do bônus para os servidores do órgão agilizarem as revisões de benefícios, previsto na medida provisória aprovada, na quinta-feira, pela Câmara dos Deputados, não devem minimizar o problema. “Ajuda a diminuir a fila, mas não resolve o problema, pois a quantidade de requerimentos aumentou muito sem ter aumentado a quantidade de peritos na mesma proporção”, destaca. Segundo ele, que tem um caso na família aguardando mais de dois anos a avaliação de um pedido, o fato de a fila virtual ter mais de 2,4 milhões de pedidos “é um absurdo”.

Greve

Procurado pela reportagem, o INSS evitou comentar os problemas e ainda criticou o uso do termo “fila invisível” ao afirmar que “seria importante especificar melhor” a situação em questão. A assessoria de imprensa argumenta que os atrasos são resultado da última greve dos funcionários do órgão e evita comentar os problemas que são generalizados. A Corregedoria-Geral da União (CGU), que deveria fiscalizar a administração pública, por sua vez, não deu retorno para comentar o assunto.

Advogados e especialistas ouvidos pela reportagem são unânimes em afirmar que um processo administrativo demora, em média, três a quatro anos, mesmo quando o pedido é uma simples atualização de contribuição devido a decisões judiciais, ou seja, não basta a Justiça dar ganho de causa trabalhista e obrigar a empresa a pagar em juízo as contribuições atrasadas ao INSS. Segundo eles, o órgão procastina o quanto pode, além de, alegar problemas para demorar para reconhecer algo que já está depositado na conta do trabalhador — e nem explica o que faz com o dinheiro que recebeu do trabalhador nesse período. A transparência diminuiu de forma relevante com a “fila invisível”, de acordo com eles.  A lentidão para liberar as aposentadorias ajuda o governo federal a cumprir a meta fiscal, pois a Previdência Social é responsável pelo rombo das contas públicas. De janeiro a junho, conforme dados do Tesouro Nacional, o deficit da Previdência somou R$ 203,6 bilhões, enquanto as contas do Tesouro e do Banco Central tiveram um superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) de R$ 192,1 bilhões.

Medidas para atenuar o desgaste

O INSS informou, ontem, que devolveu R$ 1,084 bilhão para 1,6 milhão de aposentados e pensionistas que tiveram descontos indevidos em seus benefícios. O escândalo das fraudes no INSS, em abril, revelou um total de até R$ 6,3 bilhões desviados das contas de milhões de aposentados entre 2019 e 2024, por meio de descontos não autorizados.

Para evitar um estrago maior na imagem do órgão, o governo trabalhou para ressarcir os servidores e promete devolver todo o dinheiro desviado. O pagamento está sendo feito de forma integral e com correção pela inflação, direto na conta do segurado.

Conforme os dados do Portal da Transparência do órgão, até o momento, 2,4 milhões de pessoas estão aptas para aderirem ao ressarcimento — procedimento necessário para que o governo faça os depósitos em conta. Contudo, os números do órgão mostram que ainda existem 5,1 milhões de pessoas que não reconheceram os descontos. Além disso, 44 entidades foram contestadas por cobranças indevidas.

Na avaliação de especialistas, além do ressarcimento, o governo precisa dar respostas a outros entraves, como as filas e o aumento dos precatórios.

Arnaldo Lima, da Polo, entende que, para resolver os problemas do represamento da fila do INSS, o Ministério da Previdência precisará adotar uma estratégia “multifacetada e estrutural”. “Um dos pilares dessa estratégia deve ser o fortalecimento do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), tornando-o mais robusto e preciso, de modo a permitir a concessão automatizada de benefícios com maior segurança jurídica e menor necessidade de perícia ou análise manual. Paralelamente, é urgente ampliar os investimentos na Dataprev para aperfeiçoar o funcionamento do aplicativo Meu INSS, melhorando a experiência dos usuários”, afirma.

Outros problemas que precisam melhorar, na avaliação de Lima, são o atendimento, especialmente, para a população com baixa inclusão digital, ampliando acordos de cooperação com entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e com estruturas de entes subnacionais, como o “Na Hora”, em Brasília, ou o “Poupatempo”, em São Paulo. “Também é importante o aprimoramento do modelo de perícia médica. Em vez de sobrecarregar os peritos com atendimentos presenciais em massa, o INSS deveria estabelecer parcerias com os médicos do Sistema S”, orienta Lima. Ele lembra que, após a reforma da Previdência de 2019, “é natural” o aumento nos pedidos de benefícios por incapacidade, “uma vez que as regras de acesso se tornaram mais rígidas — fenômeno comum em diversos países”.

O economista recorda que, em junho de 2019, o número de requerimentos de perícia girava em torno de 505 mil e, logo após a aprovação da reforma, os pedidos chegaram a beirar 2 milhões, “refletindo falhas operacionais”. Atualmente, conforme o próprio INSS, os pedidos de perícia médica somaram 1,02 milhão em junho.

Precatórios

De acordo com o advogado Francisco Zardo, o aumento dos precatórios nos últimos anos é resultado, principalmente, da má prestação de serviços do Estado, que acaba sendo condenado na Justiça e não cabe mais recurso. Logo, não existem “meteoros”, como o ex-ministro Paulo Guedes costumava falar para justificar a aprovação do calote dos precatórios em 2021. Zardo, inclusive, não poupa críticas à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 66/2023, a nova PEC dos Precatórios, que prevê um novo calote nas dívidas judiciais, como ocorreu no governo anterior, e, agora, ampliada para municípios, estados e União.

“A PEC dos Precatórios é um atentado à cidadania. Ela é um atentado do Estado contra o cidadão”, frisa. Ele reconhece que é difícil fazer uma conclusão sobre casos isolados, mas o Ministério Público Federal precisa investigar as crescentes falhas no INSS e no aplicativo, assim como a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que vai apurar a fraude nos descontos indevidos do INSS. O presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), autorizou, na semana passada, a instalação da comissão, que deverá ser presidida pelo senador Omar Aziz (PSD-AM).

“A CPMI do INSS daria uma grande contribuição se também investigasse as falhas crescentes no órgão, seja incompetência, seja por má administração. Essas demoras precisam ser corrigidas e a protelação é intolerável , porque é inconstitucional e ilegal”, alerta. Segundo ele, a administração pública, em geral, reconhece o problema e manda o cidadão ou empresa entrarem na Justiça “para que o direito seja efetivado” e, com isso, assoberba o Judiciário com ações que apenas buscam o reconhecimento de direitos que não são cumpridos.

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