O Caso FLORDELIS – SUSPENSÃO DE MANDATO PARLAMENTAR – PAPEL DA JUSTIÇA?

A Justiça do Rio decidiu suspender a Deputada Federal Flordelis, acusada de ser a mandante do assassinato do seu marido Anderson do Carmo, do exercício do seu mandato, determinando o encaminhamento do assunto à Câmara dos Deputados para que dê a palavra final, ao argumento de que havia “situações concretas que demonstram atos de Flordelis para atrapalhar a “busca pela verdade” no processo.”

A decisão judicial se respaldou em parecer do Ministério Público, no sentido de que a parlamentar fazia uso do cargo para intimidar e para “cooptar benesses para sua pessoa e seu clã criminoso”. Nesse sentido, o advogado que representa a família do pastor também defendeu o afastamento, acusando a deputada de atrapalhar as investigações do caso, além de fazer menção aos nomes de testemunhas em redes sociais.

Os indícios noticiados pela imprensa no sentido da participação da parlamentar no crime induzem a uma desconfiança da sociedade na sua higidez moral para o desempenho do mandato que faz com que seja atual o velho ditado grego de que a mulher de César, além de ser honesta, tem que parecer honesta. Então, questiona-se quanto à representatividade da parlamentar para o desempenho do mandato quando sob seus ombros recai a desconfiança de grande parte da sociedade de que ela efetivamente participou de um ato doloso contra a vida.

Entretanto, muito embora a manutenção da Parlamentar nas suas funções cause revolta na população, será que caberia ao Judiciário o afastamento?

Nesse sentido, a Constituição preleciona no seu artigo 55 as hipóteses estritas de perda do mandato parlamentar, estabelecendo que perderá o mandato o Deputado ou Senador:

I – que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior (incompatibilidades)

II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

III – que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;

IV – que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

V – quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;

VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado. 

Ressalte-se que não há previsão de suspensão do mandato parlamentar no texto constitucional. Vê-se que nenhuma das hipóteses autorizativas do dispositivo constitucional se amolda ao caso da parlamentar.

E não seria o caso de quebra de decoro? Poderia em tese ser enquadrado, mas daí cabe à própria Casa Legislativa declarar comportamento incompatível com o decoro parlamentar.

E já teve precedentes de afastamento cautelar de parlamentar do cargo por decisão judicial? SIM, foi o caso do ex-Deputado Eduardo Cunha, que teve o afastamento determinado cautelarmente pelo então Ministro do STF Teori Zvascki, no bojo de uma ação criminal, que também não tinha ainda sentença transitada em julgado. Posteriormente, o afastamento de Cunha foi confirmado pelo Conselho de Ética.

Ademais, interessante realçar que o processo criminal da Parlamentar não conta com foro especial no STF, por ter se considerado que os fatos em análise não guardam relação com o exercício do mandato. Ao mesmo tempo, de forma contraditória, entendeu-se que o exercício do mandato pela parlamentar prejudicaria a instrução do processo e foi nesse argumento que se calcou a Justiça do Rio para determinar o afastamento.

O jurista Ives Gandra Martins opina que o afastamento deveria ser avaliado pela Câmara dos Deputados, e não pelo Judiciário. Entretanto, a Casa não o fez, a despeito de o crime já ter ocorrido há mais de 01 (um) ano.

Com esses dois precedentes, de afastamento do mandato parlamentar por parte do Judiciário, a pergunta que fica é: a Justiça está sendo ativista ou o Legislativo está sendo omissos nas suas funções institucionais?

Marilene Matos, Professora de Direito Constitucional, Advogada e Presidente da Comissão Nacional de Direito Administrativo.

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