Com auxílio menor e desemprego em alta, volta do crescimento é incógnita

Para especialistas, ajuda emergencial conseguiu segurar queda maior do PIB, mas volta do crescimento depende do retorno dos investimentos

 

Ana Paula de Araújo Cardoso, que vende semijoias em domicílio na cidade de Piraju, no interior de São Paulo, está preocupada como vai manter a família – ela, o marido e o filho com necessidades especiais – a partir deste mês. Por causa da pandemia, ela praticamente parou de visitar os clientes. O marido, que trabalhava como motorista, está desempregado desde abril e não conseguiu um novo emprego.

A renda se resume ao seguro-desemprego, que termina agora, e R$ 600 do auxílio emergencial. “Dependo do auxílio, que vai para R$ 300 este mês. Fome a gente não passa, porque no interior um ajuda o outro. Mas a gente vai perdendo a dignidade.”

A preocupação de Ana Paula é também a de 67,2 milhões de brasileiros – trabalhadores informais, desempregados e beneficiários do Bolsa Família – que receberam até agosto R$ 600 por mês. O corte pela metade do benefício deve ter impacto no bolso da população e na economia.

Segundo o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, a redução do auxílio a R$ 300 entre setembro e dezembro terá impacto direto na atividade econômica. Nas suas contas, o Produto Interno Bruto (PIB) em 2020 deve cair 4,8%, considerando o auxílio de R$ 300 a partir de setembro. Se o benefício fosse mantido em R$ 600 até o fim do ano, a retração do PIB seria menor, de 2,5% este ano. “A diminuição do auxílio para a metade do valor tirará 2,3 pontos porcentuais do que poderia se evitar de queda do PIB este ano.”

Motor

O ponto central de preocupação, dizem especialistas, não é nem o fim do auxílio, mas a falta de um motor que garanta o crescimento da atividade com as próprias pernas em 2021.

“O coronavoucher foi um movimento correto, mas tem de acabar mesmo, porque ele é tão caro que não é sustentável”, afirma o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da MB Associados.

A questão, frisa, não é o fim do auxílio, mas é a ausência de uma recuperação dos empregos e da atividade permanente e que a economia comece a andar sozinha, com a volta dos investimentos. “O motor do investimento é o mais importante, e está ruim.”

Para o economista Fabio Silveira, sócio da consultoria MacroSector, o crescimento sustentável só virá com investimento e geração de emprego e renda. Entre junho de 2019 e junho deste ano, o número de desocupados aumentou em 10 milhões. Ele observa que um pedaço da queda na massa de rendimentos dessas pessoas o auxílio cobriu.

No entanto, argumenta, a economia tem de andar com as próprias pernas. “O que falta para enxergar 2021 é ter a sinalização de que o investimento virá e, infelizmente, não tenho essa convicção.”

Já para o economista Armando Castelar, da Fundação Getulio Vargas, se a pandemia retroceder e a confiança do consumidor se recuperar, a poupança acumulada durante o isolamento será direcionada para o consumo, a economia se recupera e o investimento virá depois. “Mas deve demorar um pouco, pois há ociosidade”, pondera.

Na análise dos economistas, a volta do investimento esbarra na grande incerteza que existe entre os potenciais investidores sobre como será equacionada a política fiscal, com déficit de R$ 900 bilhões, puxado, inclusive, pelos gastos com auxílio emergencial, e também como irá reagir a economia sem essa muleta.

Além de remover esses obstáculos, Silveira acredita que o governo precisaria construir uma transição, uma ponte, fazendo os primeiros investimentos em infraestrutura, para que o investidor retorne.

 

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