“O pilar fundamental é a preservação da vida” diz Secretário de Educação

Há pouco mais de um mês,o advogado carioca Leandro Cruz assumiu o desafio de conduzir a Secretaria de Educação do Distrito Federal em meio à pandemia do novo coronavírus

 

Há pouco mais de um mês,o advogado carioca Leandro Cruz assumiu o desafio de conduzir a Secretaria de Educação do Distrito Federal em meio à pandemia do novo coronavírus. Embora traga em sua carreira outros desafios – Leandro Cruz, entre outras atribuições, foi ministro do Esporte no governo Michel Temer- , sem dúvida evitar que os 463 mil alunos da rede pública do Distrito Federal e os seus 34 mil professores tenham o menor prejuízo possível neste ano complicado e atípico marcado pela pandemia parece ser o maior deles. Nesta entrevista ao Jornal de Brasília, ele explica que o retorno das atividades em sala de aula se dará de forma paulatina. Como se trata um corpo que está em reabilitação. E projeto o que pretende fazer mais adiante, quando o mundo de alguma forma retornar à normalidade. Da ideia original de gestão compartilhada com militares na disciplina, Leandro Cruz antecipa a ideia de outros tipos de gestão compartilhada, criando centros voltados à atividade esportiva e formação de atletas ou vocacionados à produção de cultura.

O governo do Distrito Federal criou um protocolo para a retomada das atividades escolares. Ma há muitas dúvidas entre pais, alunos e professores a respeito de como se dará essa retomada… Nossa mensagem balizadora é tranquilidade. Tudo que fizermos, faremos baseados na ciência, na observação científica, num pilar fundamental que é a preservação da vida. Não existe educação sem preservação da vida. Então,esse é o nosso objetivo. É a partir desses dois pilares – observação científica e preservação da vida – que nós vamos construir o resto. Porque tudo é secundário à preservação da vida.

Baseado nesses princípios, como se dará o retorno às aulas?

Nós vamos tratar a educação como um corpo que ficou muito tempo sem atividade. Ou seja, nós vamos voltar na reabilitação. Não teria condições de a gente voltar com 463 mil alunos, 34 mil professores, como se fosse instantâneo. A partir do dia 3 de agosto, nós vamos voltar com testagem dos professores, com ambientação dos protocolos de segurança, preparando as escolas para receber os alunos e seus professores. Daqui a algum tempo, os professores retornam para preparar suas aulas on-line, mesmo sem a presença dos alunos. Ele, professor, dará sua aula da sala, mas ela será remota. Agora, tudo isso nós faremos observando a curva epidemiológica e com um norte fundamental que a preservação da vida e a segurança dos nossos professores e dos nossos estudantes.

Com relação ao ensino à distância, existe uma pesquisa realizada pelo Sindicato dos Professores (Sinpro – DF), segundo a qual 120 mil, dos 463 mil alunos ou não tem acesso à internet ou não dispõem dos equipamentos necessários para acompanhar as aulas on-line. Como superar isso?

Não sei se foi de fato uma pesquisa, feita com critérios científicos, ou uma enquete. Até o final de julho, estamos fazendo o pagamento reverso dos dados para que todos os alunos do Distrito Federal tenham acesso à internet sem necessariamente ter que utilizar o seu pacote de dados. A Secretaria pagará para que o estudante e o professor utilizem a internet. Nós sempre teremos um dano. Nós temos estudantes sem sinal de internet, que não têm nenhum equipamento eletrônico. Nós teremos este estudante. Mas não é justo que porque a gente tem estudante que mesmo que a Secretaria faça o pagamento reverso da internet, mesmo com todas as ofertas, ele não consiga acompanhar as aulas remotas, que por isso não aconteça aula remota. E eu cancelo a aula remota por isso?

Há alguma ideia de qual seria esse universo de estudantes que de forma alguma teria acesso remoto?
Científico não. Na verdade. Você tem as regiões de Brasília em que existe mais dificuldade de sinal de internet e essas regiões são as áreas rurais. Mas mesmo nas áreas rurais você tem internet. Em algumas dessas regiões não haverá nem sinal de celular, mas aí haverá uma densidade populacional absolutamente mais baixa. Pós pandemia teremos uma política específica para tratar o dano ocasionado a essas regiões. Então eu vou ter um programa aqui que a gente batizou de “Virando o jogo”, que será usado para construir todo o arcabouço de medidas para enfrentar os danos que existirão no ano de 2020. Nós vamos ter que ter medidas compensatórias para a redução de danos.

Como o senhor explicou, o retorno será paulatino. Mas, diante das dúvidas, para tranquilizar as pessoas, como será essa volta de maneira mais detalhada?

No dia 31 de agosto, retorna a Educação de Jovens Adultos e a educação profissional. No dia 08 de setembro, a gente incorpora a esses dois segmentos o ensino médio, em torno de 13% da rede volta até o dia 08 de setembro. No dia 14 de setembro, os anos finais do ensino fundamental, incluindo aí a escola da Parque da Cidade. No dia 21 de setembro, os anos iniciais do ensino fundamental, incluindo aí a Escola de Meninos e Meninas do Parque. No dia 28 de setembro, a educação infantil. No dia 05 de outubro, os centros de ensino especial, educação precoce e classes especiais. Os centros interescolares de línguas e as Escolas Parques serão os únicos a continuar com atividades exclusivamente remotas.

Por que as escolas parques e os centros interescolares de línguas não têm previsão de retorno?

No ensino de línguas, a gente tem condições de continuar de forma remota. O objetivo é preservar vidas. Nas escolas parques, há uma circulação muito grande de estudantes por ali, mais transportes. É mais um ponto de atrito numa questão que pode ser evitada. Uma coisa é o estudante ficar sem a base mínima curricular dele, outra coisa é ele ficar sem a atividade da Escola Parque ou do Centro de Línguas. As atividades continuarão, porém, remotas.

Os professores vão ser testados de 3 a 14 de agosto, mas há professores que só vão começar a dar aula em setembro. E se nesse período, entre o exame e o retorno, que pode ser de mais de um mês, dependendo de para qual grupo o professor dará aula, ele contrair o coronavírus?

Três a 14 de agosto é um período. Mas a testagem vai estar diretamente ligada ao retorno do professor. Isso é um período de planejamento. Ele vai ser testado em baterias, seguindo exatamente essa ordem.
De qualquer modo, a atividade se dará de forma híbrida, não é isso? Parte presencial e parte remota… O período presencial será reduzido?

O período de atividades será reduzido também. É o que eu falei, é um período de reabilitação do corpo, nós queremos voltar a recuperar a capacidade cardiorrespiratória, os movimentos motores. Como se darão outras atividades que não são exatamente as aulas? Como a merenda?

Esses são os nossos gargalos maiores. Nossos dois maiores pontos de atenção são a hidratação e a merenda. Cada criança vai ser indicada a levar sua canequinha, sua garrafinha de casa, e vai ter copos descartáveis. Os bebedouros estarão obviamente todos lacrados, não vai existir isso no ambiente escolar. Vai haver torneirinha para o aluno encher o seu copo. Quanto à merenda, isso vai ser uma discussão de cada escola, mas provavelmente vai se utilizar a alimentação em ondas, utilizando a sala de aula para fazer a refeição. Tem que ver as condições do refeitório de cada escola, mas garantindo o distanciamento social e todo o sistema de segurança nesse sentido. Self service é impensável num sistema como esse. Eu pensei mesmo em fazer uma refeição seca. Mas o problema é manter a capacidade nutricional dessa refeição, que é muito importante para a criança. Então, eu vou manter a merenda em forma de comida: arroz, feijão, galinhada, proteínas, verduras, porqque as crianças precisam disso. Mas com toda segurança na entrega e no manuseio.

O senhor tem conversado seguidamente com o Sindicato dos Professores (Sinpro). Como estão essas negociações?

Nós vamos conversando. O Sinpro tem as posições dele, eu respeito. Nós temos tido um diálogo muito franco, muito aberto. Eu coloco que só não posso aceitar uma questão: a de que a aula mediada por tecnologia não pode porque existem alunos que não têm acesso à internet, ou porque os professores não estão adaptados à tecnologia, ou não têm celular, não têm computador e que aula presencial também nem pensar. Simplesmente, não entregar o conteúdo ao estudante, não dá. Nós temos tido um canal de negociação muito aberto, em que buscamos um justo equilíbrio dentro das limitações da realidade objetiva e a necessidade da entrega. O Sinpro quando levanta as limitações, ele está correto. O problema é que, mesmo com as limitações, nós precisamos fazer as entregas. Com respeito e diálogo, vamos chegamos ao possível.

E com os pais, como tem sido o diálogo?

Você tem aí de tudo. Desde pais que querem a retomada, até pais que têm receito da retomada. O que eu tenho dito é que nós vamos dar uma orientação geral. A criança retornará ao ambiente da sala de aula se tivermos as condições de segurança necessárias do ponto de vista epidemiológico.Se tivermos um caso específico, vamos tratar o específico como específico. Por exemplo: dona Maria tem sua filha, Emília, que estuda na Escola Classe 206, de Santa Maria. A menina não tem nenhuma comorbidade, mas mora com a avó de 96 anos de idade, que é quem cuida dela. Nós não vamos fazer essa criança ser um vetor para a doença da avó; então, nós vamos entender e manter essa criança na teleaula. A Secretaria, através de seus canais estará absolutamente aberta a todas as dúvidas e ponderações dos responsáveis, e esse canal vai fluir com naturalidade. O importante é que a gente passe tranquilidade e não deixe o clima de desespero tomar conta do ambiente educacional, entendendo que o fundamental é que a gente preserve o ambiente e ensino dos que mais precisam.

Tudo indica que 2021 será um ano desafiador. E a previsão é de que o orçamento talvez pouco para todos os setores, devido à queda de arrecadação que está sendo verificada este ano em função da pandemia do coronavírus. Se o orçamento do próximo ano for aquém do esperado – hoje a educação dispõe R$ 12 bilhões –, qual será a sua prioridade?

A prioridade nossa é conseguir mais recursos para a educação. O grande desafio do gestor é transformar a crise numa oportunidade, seja ele gestor público ou gestor privado. Nós estamos nos preparando para transformar a crise de 2020 numa oportunidade para a geração e não numa simples reposição formal de horas dadas de aula, como se fosse uma reposição de períodos parados como já tivemos em outros momentos no Distrito Federal e no Brasil como um todo. Nosso objetivo é que a gente tenha uma política de Estado bem construída. Onde houver recursos, nós vamos atrás, com projetos claros, orçados, bem definidos. A nossa prioridade é a recuperação desse dano causado pela falta de conteúdo no ano de 2020. Mas acima de tudo, a nossa prioridade é que a gente consiga recursos, e um recurso mais bem utilizado, para que seja possível colocar em prática toda essa política de Estado, que estamos chamando de Virando o Jogo, que terão vários programas pendurados nele, acoplados a ele com esse objetivo.

Nesse sentido da ampliação de recursos, a Câmara aprovou o novo Fundo de Educação Básica (Fundeb), aumentando para 23% a participação federal. Isso deve ser mantido no Senado. Qual o impacto que terá no Distrito Federal?

Vai ser um aumento gradual, muito importante, fundamental para o Distrito Federal, mas eu diria que além de ser fundamental para o Distrito Federal, é essencial para o Brasil. Essencial para a construção das futuras gerações do Brasil. Acho que foi um grande acerto da Câmara dos Deputados, que eu tenho certeza que o Senado Federal manterá, e nós teremos aí a garantia do Fundeb como um fundo permanente, como um auxílio permanente à educação básica no Brasil. Nós seremos muito beneficiados, e temos as condições de usar esses recursos numa política de Estado clara, que a gente consiga enfrentar os danos causados por esse período de inanição e de paralisia do nosso sistema educacional.

O senhor explicou como se dará o retorno no ensino público. E nas escolas privadas? Até onde vai a ingerência da Secretaria de Educação? Qual a autonomia dessas escolas e que obrigações elas terão?

Há um protocolo de segurança mínimo que as escolas precisam cumprir: questões de distanciamento, medição de temperatura. As escolas particulares terão a liberdade de voltar de forma presencial, híbrida ou manter o ensino à distância.. Serão fiscalizadas pela Vigilância Sanitária, pelo DF Legal, pelos órgãos de fiscalização do Distrito Federal e terão que cumprir o protocolo como todos os outros setores que estão retomando. Quanto à forma do retorno das aulas, elas têm autonomia para determinar como será a modulação.

Antes do início da pandemia, uma das principais experiências na edução no DF era o sistema de gestão compartilhada no qual a parte de disciplina passava a ser militar. Como está essa experiência e como se dará a sua ampliação?

Precisamos ampliar a ideia de gestão compartilhada para mesmo além disso. Precisamos compartilhar escola com o esporte, com a cultura. A escola é um corpo vivo e, como tal, precisa ter interações com todos os setores da sociedade. Não é à toa que nós temos aqui um dos maiores cases de sucesso, que são as escolas parques, por sua capacidade de interação, de circulação de informação. Vamos manter a política de compartilhamento nas escolas, mas tendo clara que ela pode ser diversa. Nós queremos ter aqui uma escola de rendimento esportivo de iniciação esportiva, com o objetivo de formação de atletas no futuro, ou utilização do esporte como uma ferramenta de apoio ao processo educacional. Ou escolas vocacionadas para a cultura. Eu acho que essa interação com diversos setores da sociedade vai continuar e vai ser produtivo.

 

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