De rap a show gospel, empresários são suspeitos de fraudar FAC

Brasília (DF), 29/05/19. PCDF - CECOR faz operação para prender pms grileiros de terras no sol nascente. Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Nas gestões Arruda e Agnelo, produtores musicais da cidade teriam recebido verbas públicas para produzir eventos que não foram realizados

 

Um grupo de empresários brasilienses foi surpreendido pela Polícia Civil na manhã de quinta-feira (24/10/2019). Os agentes e delegados investigam desvio de pelo menos R$ 240 mil de recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), da Secretaria de Cultura do Distrito Federal, e de administrações regionais. A fraude teria começado em 2010, na gestão de José Roberto Arruda (PL), e se estendido até 2014, na de Agnelo Queiroz (PT).

De acordo com as investigações, os produtores musicais receberam verba para produzir dois shows que não foram realizados: um era voltado para a cultura hip-hop, e outro seria um evento gospel. A ação, batizada de Operação Dark Stage, teve apoio do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).

“A suspeita é de que havia fraude na licitação. Queremos comprovar se os investigados compunham um mesmo grupo e simulavam concorrência. Os materiais apreendidos hoje devem nos auxiliar. Foram recolhidos documentos e celulares”, detalhou o delegado Ricardo Uchôa, da Divisão Especial de Repressão à Corrupção (Decor). “Além das licitações, também investigamos outras irregularidades em que eles podem estar envolvidos”, completou.

Investigação

O bando é investigado por envolvimento na apropriação indébita de R$ 240 mil, à época. De acordo com a Polícia Civil, o FAC liberou verbas públicas para a realização dos dois eventos fantasmas. “Diversas outras irregularidades foram apuradas com base em um relatório de auditoria especial da Controladoria-Geral do Distrito Federal, entre os anos de 2010 e 2014”, detalhou o delegado Wenderson Souza e Teles, que também conduz a investigação.

As irregularidades vão desde contratações por inexigibilidade de licitações – em cujos projetos básicos constavam as indicações dos artistas, com os respectivos valores a serem contratados, evidenciando flagrante direcionamento de contratação – até a descoberta de processos administrativos nos quais se verificou que representantes de empresas supostamente concorrentes agiram, de forma fraudulenta, para dotar a proposta vencedora de simulado caráter vantajoso.

Os policiais analisam documentos utilizados com intuito de justificar os preços dos cachês de artistas contratados, lesando o erário público em diversas contratações. Os crimes investigados são: peculato, falsidade documental e fraudes licitatórias. O Ministério Público informou que já entrou com diversas ações de improbidade administrativa contra envolvidos em irregularidades na contratação de artistas. Até o momento, foram obtidas nove condenações. Outros processos aguardam julgamento pela Justiça.

Segundo o promotor Bernardo Matos, da Promotoria de Justiça Regional de Defesa dos Direitos Difusos (Proerg), “a investigação da PCDF é importante porque pode trazer elementos novos para esclarecer o contexto mais amplo em que aconteceram as inúmeras irregularidades ocorridas na contratação de serviços artísticos pelo GDF”.

O Relatório de Auditoria Especial nº 5/2014 da Controladoria-Geral do Distrito Federal (CGDF) constatou irregularidades com recursos do FAC entre 2011 e 2013. Nesse período, foram gastos R$ 221.609.511,73 com a contratação de artistas. Quase todos sem licitação.

Para que seja possível dispensar a concorrência pública, a Lei nº8.666/93 determina que o artista seja “consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública”. O que se verificou, no entanto, segundo o MP, é que muitas das contratações eram direcionadas: o artista era escolhido para beneficiar a empresa que o representava, mesmo que sua carreira não justificasse a dispensa de licitação.

Segundo a mesma lei, para que a inexigibilidade de licitação seja possível, a contratação deve ser feita diretamente com o artista ou empresário exclusivo. O relatório da CGDF, por outro lado, aponta que os contratos desse período eram firmados por empresários sem vínculo permanente com o artista.

Outra exigência legal é a realização de pesquisa de preços exaustiva e a comparação entre cachês de artistas de consagração semelhante. Em diversos contratos analisados, os orçamentos apresentados para comprovação do valor pago continham evidências de terem sido forjados com o objetivo de aumentar ilegalmente as quantias recebidas. Também não havia justificativa para datas, locais, público ou artistas escolhidos.

O nome da operação, em inglês, significa “palco escuro”, em alusão às irregularidades e crimes investigados, que manchariam as atividades e eventos culturais realizados sob essas circunstâncias.

Em nota, a Secretaria de Cultura e Economia Criativa informou estar à disposição das autoridades para prestar esclarecimentos e que contribui com as investigações.

A pasta lembra que o FAC é o principal instrumento de fomento à cultura do Distrito Federal e contempla, anualmente, centenas de projetos e ações em diversos segmentos. “A secretaria tem trabalhado na construção de mecanismos eficazes para aferição da prestação de contas, e indicadores de medição de impacto social e econômico dos projetos a fim de garantir que este e outros mecanismos tenham pleno funcionamento dentro dos parâmetros legais”, destacou.

Ainda de acordo com a secretaria, é preciso esclarecer que o FAC tem papel fundamental na promoção da difusão cultural e da preservação do patrimônio, e que possíveis irregularidades em projetos isolados não comprometem a relevância do fundo para a economia criativa do DF. Somente em 2019, o FAC tem à disposição cerca de R$ 69 milhões.

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