Apesar dos agrotóxicos, mercado de mel está em expansão no DF

Apesar do uso intensivo de agrotóxicos na região, o mercado do mel cresce no DF. Saiba mais sobre essa atividade econômica e ecológica

 

Poucos seres são capazes de despertar sentimentos tão opostos quanto as abelhas. Enquanto, para alguns, são motivo de pânico, para outros, são razão de fascínio. Aqueles que descobriram o amor por esses insetos — caracterizados por três pares de patas e dois pares de asas — mantêm o sentimento vivo por meio de passatempos e profissões que envolvem curiosidade por um universo minúsculo.
No Distrito Federal, há quem se dedique aos cuidados das espécies típicas do cerrado. Um deles é o militar aposentado Heráclito Sette, 64 anos. Ele começou a se dedicar ao hobby da meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão) em 2007. Hoje, ministra cursos no Sítio Geranium, na área rural de Taguatinga.
A atividade tornou-se, segundo ele, uma maneira de “pagar a dívida com o planeta olhando para o meio ambiente”, uma vez que as abelhas sempre foram alvos fáceis da ação humana. “À medida que você conhece mais o assunto, vê que (o cenário) está cada vez pior e que é mais grave que pensávamos. A polinização é a principal função delas. E isso permite a manutenção da biodiversidade”, explica Heráclito.
No sítio onde as aulas acontecem, há cerca de 45 colmeias, com abelhas de 12 espécies nativas do cerrado. Mandaçaia, jataí, mandaguari, marmelada e uruçu do planalto — sob risco de extinção — são alguns dos espécimes encontrados por lá. Abrigadas em caixas de madeira cobertas com telhas, elas vivem aos cuidados atentos de Heráclito, deixando os ninhos de vez em quando para buscar alimento em flores de plantas próximas, como pés-de-manjericão, mangueiras e bananeiras.
Durante as visitas de estudantes da educação básica, universitários ou de participantes do curso de meliponicultura, Heráclito mostra um pouco de um mundo extenso, complexo e organizado. Há, ainda, um momento para degustação de mel, quando é possível diferenciar texturas, cores e nuances no sabor e no aroma, a depender das características e dos hábitos das espécies.
Os cursos ocorrem de duas a três vezes por ano, durante uma manhã e uma tarde. O próximo encontro está previsto para novembro. “Abrimos colmeias, retiramos abelhas, multiplicamos, colocamos todas em garrafas pet revestidas em plástico preto. Nós motivamos as pessoas a levarem-nas para as próprias casas, fazendas ou sítios”, conta o professor.

Ameaça

A relevância desses insetos é digna de destaque há bastante tempo. O papel crucial delas no processo de polinização de plantas gera preocupação por todo o mundo, principalmente pelo fato de serem responsáveis pela polinização de 75% das principais culturas alimentares do planeta, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). De acordo com o segmento da entidade voltado para a Alimentação e a Agricultura (FAO), há de 25 mil a 30 mil espécies delas na Terra. Mesmo assim, elas estão sob ameaça, e a quantidade de abelhas existentes tem caído em decorrência da ação humana.
O Censo Agro 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) identificou que 1,6 milhão dos produtores agropecuários usaram agrotóxicos em 2017. A taxa subiu 20,4% em 11 anos e a aplicação dos químicos representa grande perigo para a vida das abelhas. Extensionista rural da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF), Névio Gonçalves Guimarães trabalha com elas há quase 30 anos. Ele acrescenta que a criação, quando ocorre em áreas seguras, gera resultados positivos para a natureza.
“É um absurdo (o uso de agrotóxicos). É preciso haver mais reflorestamento e cuidado com as plantas. Tem havido invasão de abelhas em áreas urbanas, pois os lugares disponíveis para a construção de casas delas está acabando”, comenta. Névio defende, ainda, que exista mais estímulo para a criação desses insetos no meio urbano. “Se houvesse incentivo de criação de abelhas, não necessariamente só das com ferrão, daria tempo de recuperar (as florestas) e de tornar as atividades viáveis em termos de polinização”, completa Névio.

Produção que dá lucros

A produção de mel no Distrito Federal tem impactos tímidos na economia, mas gera lucros para quem investe no negócio. A fase de produção ocorre durante a seca, em um período que dura de quatro a cinco meses. Por ano, são produzidas cerca de 34 toneladas, mas apenas 10% do produto consumido é feito por aqui, segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Os outros 90% vêm de outras unidades da Federação.
Mesmo com a alta demanda, com a quantidade de espaços para criação de abelhas e com o incentivo de entidades representativas do setor, faltam interessados. Apicultor e produtor de mel de eucalipto, o presidente da Associação Apícola do Distrito Federal (Apidf), Carlos Alberto Bastos, conta que o investimento tende a gerar resultados a partir do primeiro ano da produção. “Se a pessoa tiver enxames fortes, é possível pagar todo o investimento a partir da primeira colheita. É muito vantajosa a produção de mel aqui no DF”, garante.
O mel também é produto de interesse de Sérgio Luiz Farias, presidente do Sindicato de Apicultores do DF (Sindiapis). Ele acredita que a divulgação de informações sobre o risco à vida das abelhas fez com que a quantidade de interessados pela apicultura e pela meliponicultura crescesse. “Muita gente não criava abelhas, mas começou a ver a questão da mortalidade e passou a se interessar, criar, produzir. Hoje, tenho um bocado de caixas. É uma paixão. Eu me aproximei da área por gostar delas. A produção foi consequência”, relata o produtor. “Quanto mais estudo, busco informações, faço cursos, mais encantado fico”, completa.
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