Dados do desmatamento geram bate-boca entre Bolsonaro e presidente do Inpe

Presidente diz que Instituto não pode fazer “propaganda negativa do Brasil” ao divulgar números que mostram aumento de 68% no desmatamento da Amazônia. E determina que ministros discutam os dados com o diretor do órgão

O presidente Jair Bolsonaro voltou ontem a criticar os dados sobre desmatamento produzidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o diretor da entidade, Ricardo Galvão.  Ao chegar a um restaurante, em Brasília, o presidente anunciou que vai designar um ministro para discutir com Galvão os dados de desmatamento que, na sua opinião, não correspondem à verdade. Ele acrescentou que seu governo não quer fazer uma “propaganda negativa do Brasil”.
“Eu não vou falar com ele. Quem vai falar com ele vai ser o ministro Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e talvez, também, o Ricardo Salles (Meio Ambiente). O que nós não queremos é uma propaganda negativa do Brasil. A gente não quer fugir da verdade, mas aqueles dados pareceram muito com os do ano passado, e deu um salto”, disse o presidente, horas antes de receber o ministro do Meio Ambiente no Palácio da Alvorada.
Bolsonaro afirmou que a questão ambiental no exterior é uma “verdadeira psicose” e, em uma referência ao diretor do Inpe, disse não ser justo que um brasileiro faça uma campanha contra o país. “Se o dado fosse alarmante, ele deveria, por questão de responsabilidade e patriotismo, procurar o chefe imediato, no caso o ministro”, disse o presidente. “E não de forma rasa como ele faz, simplesmente coloca o Brasil numa situação complicada”, acrescentou.
Os dados preliminares de satélites do Inpe demonstram que mais de 1.000 km² da Floresta Amazônica foram derrubados na primeira quinzena deste mês, um aumento de 68% em relação a julho de 2018. Na sexta-feira, durante café da manhã com jornalistas estrangeiros, o presidente afirmou que os dados não correspondiam à verdade e sugeriu que Galvão poderia estar a “serviço de alguma ONG”.

Acusação

No sábado, Galvão rebateu a acusação e disse que não pedirá demissão do cargo. Ele classificou como “pusilânime” a postura do presidente de “fazer uma acusação em público esperando que a pessoa se demita”. “Eu não vou me demitir”, afirmou, em clara referência ao episódio que levou o então presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Joaquim Levy, a deixar o cargo após ser criticado pelo chefe de governo.
Galvão disse também que Bolsonaro “não respeita a dignidade e liturgia do cargo”, se expressa “como se estivesse em uma conversa de botequim” e que algumas declarações dele são “piada de um garoto de 14 anos que não cabem a um presidente da República fazer”. Já o Inpe, em nota, afirmou que sua política de transparência permite o acesso completo aos dados e que a metodologia do instituto é reconhecida internacionalmente.
O Conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) divulgou manifesto em apoio ao Inpe. “Em ciência, os dados podem ser questionados, porém sempre com argumentos científicos sólidos, e não por motivações de caráter ideológico, político ou de qualquer outra natureza”, diz o texto do manifesto. “Críticas sem fundamento a uma instituição científica, que atua há cerca de 60 anos e com amplo reconhecimento no País e no exterior, são ofensivas, inaceitáveis e lesivas ao conhecimento científico”, acrescenta o comunicado. O manifesto diz ainda que o “Dr. Ricardo Galvão é um cientista reconhecido internacionalmente, que há décadas contribui para a ciência, tecnologia e inovação do Brasil”.
Ao retornar ao Alvorada, após o almoço, Bolsonaro anunciou que enviará um projeto de lei ao Congresso Nacional para legalizar a atividade do garimpo no país, sem dar detalhes. “O garimpeiro é um cidadão que merece respeito, consideração, e obviamente a gente vai casar a exploração com a questão ambiental e botar um ponto final no mercúrio”, disse. No final da manhã, acompanhado da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, Bolsonaro participou do evento “Conquistando pelos olhos da fé”, na igreja Sara Nossa Terra.

Nordeste é minha terra

O presidente Jair Bolsonaro voltou a negar que tenha ofendido a população do Nordeste, na sexta-feira, durante café da manhã com jornalistas estrangeiros. “Daqueles governadores… o pior é o do Maranhão. Foi o que falei reservadamente para um ministro. Nenhuma crítica ao povo nordestino, meus irmãos. Mas o melhor de tudo foi ver um único general, Luiz Rocha Paiva, se aliar ao PCdoB de Flávio Dino, para me chamar de antipatriótico”, disse o presidente por meio do Twitter, criticando o militar, que havia condenado suas declarações. “Sem querer, descobrimos um melancia”, escreveu.

Na sexta-feira, aparentemente sem saber que o microfone estava ligado, Bolsonaro usou o termo “paraíba” ao criticar Flávio Dino, e o governador da Paraíba, João Azevedo (PSB), durante conversa com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ao lado de correspondentes estrangeiros. Ao falar de Dino, ele disse: “não tem que ter nada com esse cara”.

O presidente foi criticado por demonstrar preconceito contra nordestinos e perseguição a um estado governado por um oposicionista. Ontem, ao retornar de um restaurante em Brasília, o presidente conversou com cidadãos em frente ao Palácio da Alvorada. E foi questionado por jornalistas se temia retaliações em sua viagem à Bahia, programada para amanhã.

“Eu critiquei dois governadores, três segundos no pé de ouvido, três segundos”, afirmou. Indagado sobre os governadores terem ficado ofendidos, monstro incômodo com a polêmica. “Ah, meu Deus do céu. Quem ficou ofendido? Não, não, não. Se eu tenho um problema com o Sul, ninguém fala.  Vocês mesmos, da mídia, ficam querendo separar o Nordeste do Brasil. O Nordeste é Brasil, é a minha terra, eu ando em qualquer lugar do território brasileiro”, disse.

Na sequência, ele perguntou: “Tem algum nordestino ofendido aí?”, ao que os admiradores responderam, aos gritos de “não”. Depois enfatizou a pergunta: “Atenção, imprensa. Tem algum nordestino ofendido comigo aí?”, ouvindo, novamente, uma resposta negativa. O presidente acrescentou que seu governo é o que “mais emprestou recursos para o Nordeste até agora, apesar do contingenciamento (de recursos do Orçamento)”.

 

FGTS: multa pode ser revista

O presidente Jair Bolsonaro afirmou que o governo “pode pensar”, futuramente, em reduzir a multa de 40% do saldo do FGTS paga a trabalhadores demitidos sem justa causa. “Olha, o valor [da multa] não está na Constituição, eu acho que não está. O FGTS está no artigo 7º da Constituição, mas o valor é uma lei. A gente pode pensar lá na frente (em alterar o valor), mas, antes disso, eu tenho que ganhar a guerra da informação: eu não quero manchete amanhã dizendo: ‘O presidente está estudando reduzir o valor da multa’. O que eu estou tentando levar para o trabalhador é o seguinte: menos direito e emprego ou todo direito e desemprego”, disse.

O pagamento da multa do FGTS é imposto pela Constituição, que determina que ela deve ser equivalente a quatro vezes o valor de 10% — ou seja, 40% — com base no que foi estipulado pela lei que criou o fundo, em 1966.

No sábado, o presidente havia negado a intenção de extinguir a multa. “Em nenhum momento, vocês da mídia vão ter um vídeo meu falando que vou acabar com a multa de 40% do FGTS”, afirmou, acrescentando que ele apenas tinha dito que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criou uma multa adicional de 40% para os demitidos por justa causa e que isso encareceu o custo das demissões. Na verdade, a alíquota foi definida pela Constituição de 1988.

Ontem, Bolsonaro anunciou, ainda, que a liberação de saques do fundo pode ser anunciada na próxima quarta-feira. “Acredito que seja quarta. A gente está precisando. Um de vocês falou ontem no Alvorada, é um paliativo? É. É uma vitamina que você tem que tomar agora, porque o ano está acabando. Você pode ver as sinalizações da Previdência, no primeiro turno, já fizeram a bolsa se estabilizar acima de 100 mil pontos. O dólar também caiu um pouco. Já tem gente preocupado que o dólar não pode cair muito para não prejudicar as exportações”, disse Bolsonaro.

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